Ionita Kesia Pereira
Ivoti / RS

 

 

Colo de pai

 

 

Noites passadas em claro, segurando a minha mão,
Ou dormindo de mau jeito, dividindo um lado do colchão.
Com braço forte, mão amiga, me erguia até a copa das árvores,
E com um afago destas mesmas mãos tirava as minhas dores.
Não sei se de fato eu dormia em seu colo,
Ou se, nas voltas para casa, fingia o sono.
Certo é que seus braços significavam descanso pleno,
Um abrigo aconchegado, amoroso e sereno.
E já crescida e independente, entrevendo símile porvir,
Com alvissareiro ânimo levou-me a vislumbrar bom futuro,
E quando o colo já não me era tão necessário,
Foi bom saber que seu olhar diligente observava-me com carinho,
E que seus passos, a minha frente, aplainavam meu caminho.
Nas escolhas da vida, seus sonhos não me apeteceram,
Mas em cada passo que dei o reconheceram em mim,
Pois as horas em sua companhia foram aulas de vida,
De se impor com equilíbrio e de vencer sem guerrear.
Quando em prosternada ascendência vi-me só e plangente,
De coração alquebrado, encorajou-me a fugir da apostasia,
E mais uma vez encontrei em seu regaço amparo complacente.
Ao entrelaçar meus dedos ao de um grande amor,
Com a mesma força de outrora, sua mão se fez presente,
Com convicção e respeito, a abençoar meu anelado propósito.
E ainda que contidas as lágrimas, me emociono,
Ao ouvir, acima de todas as vozes, dito por ele, meu nome,
Impelindo-me, com a convicção de quem confia em meus gestos,
Como se olhasse a si próprio, em um espelho.

 

 

 
 
Poema publicado na Antologia de Poetas Brasileiros - vol. 165 - Outubro de 2018