Francisco Ferreira
Conceição do Mato Dentro / MG

 

 

Um cadin de mineirês

                

 

De que nós mineiros temos um modo muito peculiar de falar, o resto do mundo sabe, atesta e passa recibo, mas é preciso ressaltar que existem expressões e palavras que só sendo mineirim para entender. À medida em que adentramos os confins das Gerais, essa diferença aumenta um mucadinho. O mineiro não anda em calçadas, mas toda boa mãe mineira sabe que precisa recomendar aos filhos pequenos ao saírem de casa:
− Óia lá, hem? Cê num sai do passeio não! E óia pros dois lados antes de travessar a rua.
Quitanda, que é para a grande maioria dos brasileiros, um estabelecimento comercial, é para nós algo que nossas avós e mães faziam, pelo menos de quinze em quinze dias, nos antigos fornos de cupim, para os lanches (tira ou quebra-jejum, merenda e ceia) da família e convidados.
O tradicional copo paulistinha ou Nadir Figueiredo, aqui tem outro nome, como atesta nosso amigo, Velho Horácio, o Sofredor:
− Oh sô moço, num faço questan de marca de cerveja. Se tivé gelada e no copo lagoinha, tá bão!
Ao cumprimentar um mineiro do interior você obterá uma infinidade de respostas: “tô aqui duma banda”, “tô pelejano”, “tô penano e durano”, “bem! E vós?”, “meia pedra e meio tijolo”, “maisomeno mar mar”... Se algum mineiro lhe disser que “é ali, mês...” esteja atento, pode não ser tão ali assim, no entanto, se ele lhe disser: “é pirtim, um tirim de espingarda” prepare-se para uma boa viagem. Mas se for longe de fato, daí sim, é “sete cabos de machado pra baixo dusinferno”.  Em Conceição do Mato Dentro ao norte chamamos de o lado de baixo, como as chuvas normalmente vem da direção norte, da minha Tapera querida, “mode quê, chuva certa mês é a que vem de baixo. Do lado de cima, arma arma, faz baruio, mas dá só um sirinim”.  Provavelmente sejao único lugar onde acontece esse raríssimo fenômeno meteorológico: chover de baixo para cima.
Aqui, quando um “bebo tá amolano no buteco”, o dono do estabelecimento lhe diz logo:
− Bebeu, cuspiu; pagou, sumiu! Té logo e tal!
Aliás, para se despedir de alguém que não está nos agradando seja pela companhia ruim ou quando só queremos um dedo de prosa e o sujeito extrapola, sobretudo no uso de palavras feias, a gente diz: “vai varano”, “vai dizeno, vai dizeno!”, “quebra a esquina. Digero, viu?”  E, nessas bandas, “angu e o torresmo, o gosto é o mesmo. Quarquer cuscus tem quejo.  Cuspiu lambeu, trabaiô recebeu”.  E a melhor delas, o famoso nóóóóó! que corresponde, i o seguinte:
Valei-me Nossa Senhora da Aparecida!

 

 

 

 
 
Publicado no Livro "Bem-me-quer, Malmequer" - Edição 2018 - Março de 2019