Maria Rita de Miranda
São Sebastião do Paraíso / MG

 

 

Começar de novo

 

 

          Vane é uma conhecida de muitos anos. É cheia de complicações. Desde que comecei a ter contatos com ela me vi às turras com problemas, incompreensão, falta de dinheiro, conflitos, malmequer, insatisfação, inconformismo, amargor e recentemente, com seu ex.
          Saída de um casamento de mais ou menos vinte anos, onde tudo acima acontecia, tornou-se uma falante inveterada da vida pós-matrimonial.
          -Você se lembra, diz ela, do Val? Pois é, ele mesmo. Enquanto estava comigo, fazia de tudo para me sentir inexistente. Mal falava comigo. Criticava-me muito. Deixava-me sozinha quando ia às festas que sua família promovia. Evitava aparecer comigo em público e outras coisas mais.
          Era aliado de nossa filha e Eli sempre estava do lado do pai. Ela falava, o pai concordava. O pai resmungava, ela ria dizendo que ele tinha razão. Parece que se juntaram para declarar guerra contra mim.
          Dois contra um. Tornei-me a parte fraca. Então as brigas começaram e a gritaria também. Ninguém tinha razão. Bastava um emitir opinião sobre determinado assunto, para o outro, veementemente, dar o contra. Nada funcionava a contento.
          Val sempre ameaçava sair de casa, mas não ia. No fundo, eu dava graças a Deus, pois não me imaginava solitária. Achava que seria pior. Pelo menos tinha uma família, ainda que desestruturada.
          Até que um dia, já acostumada com nossa situação conflitiva, ouvi meu marido dar o ultimato: - vou-me embora! A princípio não dei importância. Tantas vezes já havia dito a mesma frase... O que não percebi, de imediato, foi que desta vez ele falou com tranquilidade e não exaltado por causa de uma discussão. Frase pensada, premeditada, conclusiva.
          Tentei conversar com ele. Admito que queria uma reconciliação. Ele foi inabalável. Bastava encontrar um local para morar e nada mais o deteria. Passei dias inconformada tentando me preparar para ficar sozinha com minha filha. Nessas alturas dos acontecimentos, Eli dava muito trabalho pela falta do limite que eu não consegui impor e pelo pai que insistia em ser permissivo demais.
          Val anunciou sua saída de casa, na véspera. A notícia, para minha admiração, deu-me certo alívio. Só não esperava que Eli escolhesse partir com ele, mas ela foi. Ao vê-los saírem não senti alegria ou tristeza. Apenas a indiferença tomou conta de mim. Durante muitos dias me sentia flutuar. Procurava me convencer de que tudo ia melhorar. Quem sabe de longe, eles dariam o valor que eu merecia.
          Mas não. A situação só piorou. Eli fazia questão de dar notícias do pai. Dizia que ele estava frequentando baladas e que arrumava uma namorada atrás da outra. Por mais que quisesse me manter indiferente, não conseguia. Depois foi o tormento do divórcio. Val queria fazer acordos absurdos. Eu perdera a noção do valor das coisas materiais. Enfim, entre idas e vindas, o acordo foi feito.
          Hoje sei que ele tem uma nova companheira e está muito bem. Eli está se distanciando de mim. Eu continuo solitária, mas confiante. Quero refazer minha vida. Encontrar um novo amor. Ser feliz. Sei que mereço!

         

 

 

 

 
Poema publicado no livro "Contos de Amor e Ódio" - Julho de 2018