Isabel Cristina Silva Vargas
Pelotas / RS

 

 

Notícias do além

 

        

          Chamei um carro pelo aplicativo, como sempre faço quando desejo sair. Para quem gosta de um papo foi a melhor coisa que inventaram nos últimos tempos, principalmente para alguém como eu, que passo a semana inteira sem conversar com alguém. Isso não é queixa, é constatação. Gosto porque encontramos pessoas de todas as idades, cada um com uma história de vida e objetivos diversos. Em comum, a necessidade de ganhar a vida enquanto não se estabelecem em algo relacionado àquilo para qual se prepararam. Biólogos, arquitetos, professores, estudantes, pessoal da área de exatas. Desta vez entrei em um carro dirigido por uma mulher, que me pegou em casa. Jovem, cabelos longos, tatuada, comunicativa. Sentei ao seu lado e começamos a conversar. Os assuntos, geralmente, versam sobre o país, a situação econômica, a crise que assola o estado, o tempo, a situação precária das vias do balneário, dificuldades do dia a dia, família, etc.  Sinceramente, não recordo nosso assunto inicial, só que eu dei uma risada e disse que eu já era velha, ao que ela retrucou  de forma veemente dizendo que isso não era verdade. Posso não aparentar, respondi, mas sou velha, sim, e informei minha idade. Simpática ela afirmou não parecer. Enfatizei que já havia vivido coisas ruins ao que ela indagou se eram perdas. Respondi de forma afirmativa, salientando que já tinha tido várias perdas, inclusive a de um filho. Desejou saber mais sobre ele ao que respondi, pois não me furto de falar. É assim que o mantenho sempre vivo em mim. Ao término do relato ela me fala em religião, com quem tinha trabalhado, e me pergunta se meu filho era moreno, alto, forte, porque ela via alguém assim próximo a mim. Disse-lhe as características de meu filho e que sabia a quem ela se referia. Pelas coisas que me falou identifiquei meu irmão. Ao nos despedirmos, pediu para me abraçar, ao que respondi de forma afirmativa e um tanto sensibilizada.

          Ao chegar no local para o qual me dirigia ouvi mensagem no celular e vi que era de meu sobrinho, filho desse meu único irmão e que eu já havia pensado em chamá-lo para saber notícias dele e meus sobrinhos-netos. Há dois anos que não nos encontrávamos. A última vez foi no funeral de meu irmão. Ao começar a relatar o ocorrido a ele, comecei a chorar por perceber que era exatamente este dia que completavam dois anos de seu falecimento.

 

 

 
 
Poema publicado no livro "Causos e contos do cotitidiano" - Edição 2019 - Março de 2020