Francisco Ferreira
Conceição do Mato Dentro / MG

 

 

Duelo

 

        

Na cara dele, eu oiei. Em dentro dos’óios. Modos que ele soubesse: medo dele eu num carregava. Tinha era enjeriza. Muita. Aliás, medo é coisa que nunca carreguei. Meu picuá é piquininho e só cabe uns poco treins e meus petrechos de pitá. Temor assoda a gente, amufina. E num é bão conseieiro e nem nada.

Ele, aquele, o muxibento, é caboco istúrdio.  Vive ne sombra de mulher e gosta de se gabá de que é home de peso e medida. Bocudo e de boca porca. Véio besta, o Jão Manco (ele, aquele, o fiédazunha) que puxa duma perna – coice de vaca que destroncô a tremela do jueio, lá dele, que o deixô assim. Sujeito bobo, catiadô de marra, metedô de cara, disinquetadô de famíia dus’outro. Sonso, sambanga. Um cutelo e frajelo pros dele.

− Rai’xente. Ai dele se me pisá no calo. Pranto nele a lapiana, até no cabo. Até onde custô meu dinheiro. Fass’uma misera.

Ansdeonte mi’oiô de banda, de meia jota, cô’a cara de tatu de cimitério. Firmei no estribo da besta Risoleta, balanguei as rédea, parpei na garruchina  e na viana e apurei o faro. Rupiei. Modos que, de cavalo veiaco a gente tem sempre d’isperá um coice, de boi sonso, uma cabeçada e de sujeito que num presta, trapincolages. Fez poco e passô de banda, assim como se num fosse qu’ele.

Esbarrei na porta da venda de Sô Tote, disapiei da Risoleta e,conforme entrei, já dei meia vorta. O dianho, ele, aquele, tava lá no barcão co’a cara de quem tá cum rei na barriga. Até quebrei pau no ovido pro dono da venda que me sodô. Trevessei a rua e entrei na venda de Bidi. Pidi uma canjibrina e um botinm de porva preta. Dispejei um tiquim de porva na cachaça, mexi bem co’a ponta da curvelana e virei de um golo só. Nem num quemô na goela. E exprico: “Modos de dá coragem e tanto pra brigá, num tem nada mió do que bebê pinga com porva.” – Bidi raiô cumigo:

− Se ocê tá quereno arenga, vai caçá outro lugar pra fazê disorde. Aqui num tulero bagunça. – Dei só um muxoxo, ranquei da gibera uma nota de cem e falei arto e grosso:

− Decá meu troco. E em cobre vivo e nota de paper que num quero sabê de nico, prá vazá do buraco do borso e eu perdê meus priscos. – Bidi murchô. Num tinha troco pra tanto. Mandei apontá na caderneta e cuspi no chão. Modos de mostrá qu’eu num ando com cisma e nem mamei em mulher morta.

A pinga temperada com a porva e o zinabre da faca subiu direto, zonziou meu coco. Na saída trupiquei numa taba do suaio e só num rachei no chão porque bati a testa no peito do disgramento, ele, aquele, que tava intrano na venda. Garrei no portal e falei com raiva: “Arreda qu’eu tô passano”. Montei na besta e saí de passo, que, treis vez de cadeia é sinar de forca.

Imbiquei Risoleta pros lado lá de casa e morguei o corpo em riba da sela, modos de batê a binga e acendê o toco de pito. Quando levantei a cara, no fim do  Beco da Sinh’Ana, óia se num era a pustema do sujeito, ele, aquele, vino pros meus lado co’um trem na mão. Sei lá se era um pau de lenha ou uma foice do cabo curto. Sei que alí tinha trem. Pensei: “Bão! Ness’istradinha só cabe eu e minha mula, que qui’esse fiedamãe tá caçano? Ess’trem num vai prestá.” E... topemo no mei do beco. Ranquei da garruchinha, toquei nas fuça do infiliz, bem nas venta, escanchelei os dois cão e puxei o gatíio. A HO só fez “trac, trac”. Mascô a fiedazunha. Mas foi o que foi priciso. Dess’ora indiante o tar do sujeito, ele, aquele, corre de mim que nem o diabo da cruz. E eu, que num sô bobo e nem nada, corto vorta é grande pra num passá nem perto dele. Afinar, cobra a gente mata é bem matada, num machuca ou ispanta só...

 

 

 
 
Poema publicado no livro "Causos e contos do cotitidiano" - Edição 2019 - Março de 2020