Maria Rita de Miranda
São Sebastião do Paraíso / MG

 

 

Ida à fazenda

 



Você conhece um “unimogue”? Era um caminhãozinho, o nosso verde, que rodava nas esburacadas estradas de terra até chegar ao Morro Vermelho. A fazenda está situada a 20 quilômetros da cidade. Mas como parecia longe... Saíamos bem de manhãzinha: mamãe, papai e a maioria dos irmãos. A viagem era uma verdadeira aventura. Papai e mamãe iam ao banco da frente e nós, os filhos, na carroçaria. Como era barulhento o unimogue. Meu pai colocava-o para funcionar de madrugada - levava tempo para esquentar a máquina - e aquele barulho de motor persistia durante todo o trajeto. Ele andava tão devagar que parecia que nunca ia chegar ao destino. E como aquela carroçaria pulava! Mas ninguém reclamava. Papai dizia: - hoje nós vamos. E nós íamos. Parávamos sempre numa bica de águas cristalinas para matar a sede. Papai pegava o seu chapéu de feltro cor de cinza, colocava água em sua aba e nós, um a um, tomávamos. Que água pura era aquela. Depois o recomeço da viagem e eu sofria muito com os meus enjôos. Papai parava mais uma vez e dizia: - vá você e sua irmã correndo na frente que o enjôo passa. Descíamos e corríamos. Parece que o unimogue nunca nos alcançava. Como era lento! E o enjôo passava mesmo. Parada, subida, e tudo recomeçava.
         Quando chegávamos à sede da fazenda estávamos todos tão empoeirados que os nossos cabelos haviam se mudado de cor: do castanho para o vermelho. Cada um de nós tomava um rumo. Que correria! Íamos ver a água que passava nos fundos da casa, o pé de flor que parecia nunca ficar nu, a laranjeira alta e antiga com as laranjas panásias que eram muito doces. Até a hora do almoço era aquele burburinho e a mamãe chamava: - venham almoçar. Cada um se defendia como podia. Sentávamos em volta da mesa e mesmo na soleira das portas. Aquela comida tinha sempre um gosto especial. Mamãe era ótima cozinheira.
         Mais tarde, papai decidia que íamos subir a serra. Lá em cima tinha uma colônia: uma sequência de casinhas iguais, onde moravam os colonos. Eu gostava de ir até lá, mas a subida era outra aventura. O unimogue, aos solavancos e lento, parecia, às vezes, que ia tombar para trás de tão empinado que ficava. E quando olhávamos para baixo... era o precipício. Eu sempre tinha tanto medo! E meus irmãos zombavam: - olhe... agora vai cair. E riam muito dos que se apavoravam.
          Lá na serra as pessoas nos tratavam muito bem. Alguns serviam biscoitos, outros doces de leite cortados em grandes quadrados. Ficávamos lá por algum tempo, até que papai desse as suas ordens aos trabalhadores. Novamente solavancos, poeira, buracos e muita demora até chegarmos a casa, já de noitinha. Estávamos cansados, mas felizes. Ajudávamos a descarregar o unimogue, pois sempre trazíamos alguma fruta ou legume. Cada um tomava o seu banho depois de muita briga pelo primeiro lugar, já que era um único banheiro e quem tomava banho primeiro desfrutava da água mais quente do chuveiro que era aquecida à lenha. Estávamos cansados, mas isto não nos tirava o ânimo de inventar novas brincadeiras até a hora de dormir. Cansados e felizes!

 

 
 
Poema publicado no livro "Contos Fantásticos" - Edição 2019- Outubro de 2019