Claudio Carvalho Fernandes
Teresina / PI

 

 

Su Wu pastoreava carneiros

 

 

Su Wu era um importante funcionário civil da dinastia Han da antiga China. No ano 100 antes de Cristo, quando o imperador Han Wudi planejava atacar o vizinho país Xiongnu este enviou um oficial para pedir paz à dinastia Han. Em consideração, Wudi enviou Su Wu a Xiongnu para exprimir a boa vontade de sua dinastia.
Su Wu, levando na mão um jinguiê, isto é, um sinal representativo da corte dinástica, com seu auxiliar Zhang Cheng e alguns subalternos, chegaram a Xiongnu. Quando ele, no cumprimento de sua missão, estava pronto para retornar, ocorreu algo inesperado.
Antes de Su Wu ir a Xiongnu, um outro funcionário da dinastia Han, chamado Wei Lu, capitulou e foi altamente considerado, elevado a importante posto pelo chefe de estado em Xiongnu. Wei Lu tinha um subalterno denominado Yu Chang, que estava descontente com Wei Lu por causa de sua rendição. Yu Chang aconselhou-se com seu amigo Zhang Cheng, o auxiliar de Su Wu, para rebelar-se, mas ele fracassou e foi capturado. O chefe de estado de Xiongnu, Chanyu, encolerizou-se muito e ordenou que Wei Lu interrogasse Yu Chang e procurasse cúmplices.
Disso Su Wu não sabia totalmente até Zhang Cheng dizer a ele a verdade. "Se Yu Chang confessar, nós todos seremos intimados. Acaso não perderemos o semblante de nossa corte?". Dizendo isso, Su Wu desembainhou a espada para se matar. Todavia Zhang Cheng o impediu e com os outros o convenceram a viver.
Yu Chang suportou diversas punições mas de modo nenhum confessou que Zhang Cheng fora cúmplice. Não tendo recurso, Wei Lu relatou a Chanyu. Após isso, Chanyu já não quis ser indulgente com Su Wu. Ele, então, mandou Wei Lu para fazer render-se Su Wu.
Ao ver que Wei Lu vinha para capitulá-lo, Su Wu disse: "Eu sou um enviado da dinastia Han. Se não posso cumprir minha missão, perco o espírito, como posso viver sem rosto?". Novamente ele tirou a espada para cortar o seu pescoço. Wei Lu rapidamente o abraçou, todavia  Su Wu desmaiou por causa de grave ferimento. Após um longo tempo de cura, Su Wu readquiriu a consciência.
Chanyu admirou muito Su Wu por causa disso, opinando que ele era um homem com espírito. Após Su Wu recuperar-se, o chefe de estado enviou de novo Wei Lu para lhe depor as armas. Então Yu Chang já havia morrido enquanto Zhang Cheng rendeu-se por causa da ameaça de Wei Lu.
Assim, Wei Lu disse a Su Wu: "Eu capitulei de fato obrigado por Xiongnu, mas o chefe de estado, Chanyu, tratou-me bondosamente, colocou-me em importante posto, deu-me dez mil súditos e incalculáveis bois e carneiros. Eu  agora  na verdade  gozo toda sorte de felicidade aqui. Se você se render, receberá o mesmo".
Mas, estourando de furioso, Su Wu levantou-se e censurou Wei Lu: "Você é filho de Han, outrora funcionário da dinastia Han, mas esqueceu o bisavô, esqueceu os pais, esqueceu o bem da corte, descaradamente fez-se um traidor da nação. Que espécie de rosto você tem para falar comigo? Eu de modo nenhum capitularei, apesar de todas as coisas que você fará".
Ouvindo o relato de Wei Lu, Chanyu logo prendeu Su Wu numa adega vazia, a fim de que ele se flexionasse diante de um longo tempo de sofrimento. Houve inverno, externamente esvoaçavam flocos de neve e plumas. Su Wu tolerou o frio e a fome, alimentando-se com tiras de couro e sola. A sede ele saciava com a neve.
Dias após, achando que o sofrimento não era eficaz, Chanyu mandou Su Wu pastorear carneiros junto a Beihai, dizendo: "Você poderá retornar a vossa pátria quando um macho de ovelha parir um filho".
Ao pé de Beihai, Su Wu já não tinha ninguém nem nada consigo além do jinguiê que representava a sua corte. Ele pastoreava carneiros o tempo todo com esse jinguiê na mão, esperando que um dia pudesse retornar ao seu país natal. Mas o tempo passou, dia após dia, até o jinguiê fazer-se um bastão despido, porque suas borlas caíram totalmente dele.
Somente dezenove anos depois os dois países reconsideraram sobre paz. Su Wu, assim, finalmente pôde retornar a seu país, após um sofrimento insuportável para um homem comum, com barba branca, cabelo branco. Ele sempre teve o jinguiê todo nu e sem penacho, como precioso símbolo de seu país. Muitos dos moradores das capitais vieram para lhe dar as boas vindas, e com lágrimas o aplaudiram: "Eis aqui  verdadeiramente  um grande homem".

 

(Conto chinês de Chen Hongying  traduzido, através do Esperanto, por Cláudio Carvalho Fernandes de original da revista "Kontakto" publicado na página 12 do  número 121, de janeiro de 1991.)

 

 
 
Publicado no Livro "Contos que copiam os sonhos" - Edição 2018 - Novembro de 2018