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Romilton Batista de Oliveira
Itabuna / BA

 

  A única sedução segura com passaporte
para a eternidade

 

          

Ele era um menino frágil e munido de uma força que advinha de um lugar que ele não sabia explicar. Lutava com a doença que lhe envergonhava todas as vezes que a crise lhe vinha. E quando ele entrava em crise na escola, a vergonha era ainda maior. Vivia a tomar remédios cotidianamente e perdeu uma tia que muito a amava exatamente com esta mesma doença. Mas isto passou, ficou lá bem longe de seu atual presente, mas ainda lhe sobrevém à mente quando vê alguém a sofrer deste mal, ou mesmo quando está a ler algo que o remete a pensar neste passado que o amedrontou em sua infância e em sua adolescência.
Hoje, depois de tantos e tantos anos passados, lendo o romance Esplendor de Portugal, o passado lhe veio repentinamente à sua mente. Uma memória frágil tornou-se potente no momento em que a personagem Isilda narra a dor de seu filho Rui. O autor deste grande romance soube citar a problemática deste assunto e o sofrimento que ele causa em seu portador. O escritor António Lobo Antunes mostra no romance a cena não aleatoriamente, mas seu objetivo é exatamente desconstrutor e crítico, narrando e descrevendo o preconceito e o abandono em que o doente passa na sociedade, e até mesmo em sua própria família.
E de repente, o narrador, num rápido suspiro, pensou em seu passado. Imagens o cercaram em pleno momento em que ele estava a estudar na Biblioteca Central, na esplêndida Universidade em Covilhã, maravilhosa cidade portuguesa. Respirou profundo, e percebeu que o passado apenas nos serve de alerta e de refrigério reconstrutor capaz de nos equilibrar em nossa complexa existência aqui na terra. Meditou, e foi tomado por uma satisfação infinitamente divina e poética que lhe transmitiu uma secreta paz, vinda do etéreo sopro divino de Deus...
Ele jamais esquecerá de que também já foi este Rui, doente, frágil e violentado por suas sombras e fantasmas. Mas ao se ver no presente, percebe o quanto Deus o amou, e o libertou desta enfermidade que, para muitos, é incurável. Este narrador que vos fala é um sobrevivente da vida, não só de uma catástrofe, mas de muitas que ele presenciou e que aqui neste texto híbrido, interpelado pela narrativa em extensão, não poderia descrever com a clara exatidão do real em construção. Entende perfeitamente que a autobiografia como recurso literário é um bom caminho a ser seguido, e um dia, pretende expor por sobre esse gênero que se contamina por meio do imaginário fictício, suas fragmentadas histórias de vida, sua sobrevivência diante de tantas mortes que sobrevieram sobre si, e qual o gênero ou conhecimento filosófico, psicológico, antropológico e científico não sofre a interferência do ponto de vista de seu observador, ou seja, da subjetividade de alguém que escreve a partir de seu lugar discursivo? O silêncio é a porta aberta que explica muitas das questões que atormentam o juízo do pensador, o sedutor ideal das horas não tão exatas que adentram nosso mundo repleto de restos, rastros e resíduos do passado.
Mas, voltando-nos ao que fora dito no início desta tentativa autobiográfica, hoje, esse narrador que vos fala, está totalmente curado, e consegue trazer lá do passado mnemonicamente situado, as vozes de pessoas da família e de seus próximos que assim diziam: “Pobre menino, não vingará!” “Fraco garoto, portador de uma doença que não tem cura!”, “Creio que não viverá muito tempo!”, “Coitada da família deste ‘deficiente’!”, “Se ele soubesse o que dizem dele, eu gostaria de não estar em seu lugar”, etc., etc., etc. Uma sociedade repleta de preconceitos era aquela em que eu vivi, e que ainda continua viva em nossos dias, pois mudam-se os tempos, mas os discursos se revestem de novas máscaras ditas “inclusivas”. Na realidade continuam produzindo discursos que escondem discursos por meio de suas pseudo-sólidas formações ideológicas. O real continua dando rasteira no próprio real, e o homem continua fingindo que ama o próximo do jeito que ele é. Vivemos e convivemos com a falsidade enroscada nos rostos de homens e mulheres que se sentem portadores da saudável herança do perfeito equilíbrio-maior. Não percebem que esse equilíbrio é inexistente, a não ser que sejamos abraçados e tocados pela forte mão de Deus que é a única fonte de Poder e Sabedoria capaz de dar ao Homem este perfeito equilíbrio-maior, pois Ele é a Verdade que o Homem tem dEle se desviado. Eu posso provar pois fui, como tantos outros o foram, tocado por um pouco do fenômeno que a tantos ainda amedrontam. Pela misericórdia divina, eu sobrevivi para, por meio da literatura, tirar de mim um pouco destes tenebrosos momentos de horror, sedução inquieta e reprodutora de perda de identidade e da essência humana. Estar vivo e ser sobrevivente de tantas mortes que me cercaram é certamente ter sido escolhido por Deus para hoje ser o escritor que sou, um ser ainda em construção, pois nada está feito, tudo estar por se fazer. Somos o barro feito e desfeito, manuseado e tecido, construído e desconstruído pelo Criador, de acordo com o que escolhemos ser para viver. A vida é uma escolha, e só depende de nós escolhermos o caminho do bem, e assim, a cura virá... Juntamente com o que plantamos em nosso rápido “Jardim de flores”. Eu, o narrador e personagem desta sobrevivente história, sou prova viva de que em Deus somos mais que vencedores. E nossa vitória se deve tão somente naquilo em que nós cremos. Assim, o mundo será melhor quando, no lugar da violência e da corrupção plantadas pelos mortos seres humanos, nascer a lídima consciência de que tudo na vida é efêmero, reconhecendo que estamos aqui apenas como passageiros de um tempo-espaço definido e fixado por Deus. Portanto, vivamos cada dia de hoje como se fosse o último dia de nossas vidas, semeando amor, paz e perdão, pois somos todos iguais diante de Jeová. O que nos difere é exatamente o que fazemos de nossa vida. Ou aproximamo-nos de Deus ou distanciamo-nos dEle. Ele é tão completo em sua misericórdia e mansidão que nos dá o direito de segui-Lo ou não, mas o melhor que temos a fazer é segui-Lo, se quisermos ser felizes e ter amor para dar e “vender”, vender não no sentido mostrado pelos jornais escritos e televisionados, mas no sentido de dar sem esperar nada a receber, pois o que fazemos de bem ao próximo, Deus é quem nos recompensará. Ele é fiel. Deixemo-nos ser seduzidos por Ele. Esta é a única sedução segura que tornará o mundo um lugar plenamente “iluminado”, a única sedução segura com passaporte para a eternidade.

 

 
 
Conto publicado no livro "Contos de pura sedução" - Janeiro de 2017