Teresa Cristina Cerqueira de Sousa
Piracuruca / PI

 

 

Uma criança na casa

 

Era uma casa pequenina de apenas três cômodos, mas com varanda ao redor. Lançava-se para a estrada, por estar muito perto do portão.  A vistosa mangueira espantava o dia quente nos fundos da casa; era desse lado que se via a tia-avó num fogão a lenha sem chaminé... A fumaça, no entanto, parecia não querer entrar em casa e se perdia em subidas e descidas na varanda até que um vento mais forte a borrifava talvez para as margens do rio próximo.
O olhar da tia-avó ia das panelas no fogão para um ipê inda florido. Era início de novembro. O verão seco empalidecia ainda mais as flores amarelas que caíam no chão. A árvore, sem palavras, erguia seus galhos quase nus para o alto. Vivia assim alheia à perda de suas flores. Logo ganharia folhas, para iniciar um novo ciclo, sabia disso. A natureza seguia apesar do verão quente e seco no semiárido.
Por que se lastimar?, pensava a senhora. Antes cuidar nos afazeres, ouvindo os pássaros nos galhos da velha mangueira, que fechar a cara, amuada com a vida, e o dia passava sem se ver o azul do céu se destacando por entre umas poucas nuvens brancas.
Neste momento a tia-avó observa a menininha da casa passar correndo rumo ao rio atrás de uma borboleta. Era uma criança rechonchuda de saúde em seus dez anos. Algumas folhas de um mamoeiro, ali por perto da varanda, também se mexiam – queriam seguir rumo ao rio por onde o vento era mais fresco. Todavia, logo se houve um choro: Buá-á-á!
A menina topara numa pedra, das várias que ficavam no caminho até o rio. Embora fossem somente nove horas, já tinha choro! Oh, Deus do céu!...  O dia seria hoje assim, com choradeiras, gritos e pulos até quando o sono vencesse a pequena, por volta das vinte horas e ela fosse dormir? Machucara um dedo? Ou apenas se sujara de areia?  Ou será que perdera a borboleta de vista?
Minutos depois, já se ouvia o voo de um beija-flor pelo pé de ipê. Longe, os risos e gritos da criança. E no fogão a lenha a panela de pressão assobiava jogando um pouco do cheiro de galinha caipira no ar.
Então, se ouve a avó da menina, narrando: “E Aninha não levou o chapéu como sempre! Essa menina corre da hora que acorda ao anoitecer...!”
Na mangueira, os frutos maduros nas pontas dos galhos. E a avó resmungando que o vento derrubava todas as mangas maduras e que a menina não servia nem para colhê-las!
A mãe dela também fora igualzinha na infância... ! Corria feito o vento...! As duas mulheres de volta ao passado sorriam das lembranças. Mas as memórias eram tristes ao recordar que a mãe de Aninha morrera de parto... E, oh, a menina era a cara da mãe!... A menina também era a alegria da casa.
E lá vinha a pequena... Ah, os sonhos se desenhavam no rostinho infantil – a casa tinha felicidade... Ora, a vida andava e se movia iluminada nos passos de uma criança...
 

 

 

 

 
 
Poema publicado no livro "Contos de Verão" - Edição 2019 - Fevereiro de 2020