Otaviano Maciel de Alencar Filho
Fortaleza / CE

 

 

A festa dos vegetais

Uma lenda saborosa...

Houve um tempo em que os vegetais viviam como os seres humanos vivem hoje. Cada espécie tinha os seus afazeres e assim todos levavam uma vida muito parecida com a que nós, humanos, levamos hoje em dia. Foi um tempo distante, mas muito distante do tempo atual, sequer a mãe Terra imaginaria abrigar seres como nós, humanos.
Entre eles, a vida social, entretanto, tinha lá os seus problemas. Como suas variedades eram muito grandes, ficava difícil uma convivência amistosa entre algumas espécies. Por exemplo: Como árvores de grande porte poderiam conviver com as espécies menores sem que lhes causassem algum tipo de desconforto? Um problema crucial era justamente os acidentes provocados pelas “pisadas” que as plantas pequenas e as gramíneas recebiam constantemente. Além disso, ficavam privadas da luz solar, e assim não realizavam a fotossíntese, indispensável à vida orgânica.
Após muitas discussões a respeito de como se daria a convivência social entre as diversas espécies, ficou definido que cada espécie se estabeleceria em áreas específicas: as árvores frutíferas formariam os pomares, as hortaliças as hortas, outras árvores formariam as florestas, outras tantas formariam os mangues e assim por diante, cada qual segundo suas espécies.
Vamos falar de um caso acontecido com a espécie que, com o passar dos milênios, e após o surgimento da espécie humana, tornou-se uma das mais apreciadas por esta, por ter grande serventia na culinária: As hortaliças.
Essa espécie era uma das que melhor conviviam entre si. Sentiam-se portadoras das melhores benesses que a terra poderia lhes dar: um solo arenoso cheio de nutrientes capazes de lhes garantir uma existência glamorosa.
De tempos em tempos, eles promoviam festivais ornamentais onde todos se divertiam durante um mês. Em um desses festejos, talvez o maior já realizado, aconteceu algo de inusitado, e que foi prejudicial e decisivo para a convivência pacífica entre todos da classe.
No dia da festa estavam de prontidão na entrada da horta, servindo de porteiros, o Inhame e a Abóbora. Ambos garantiriam somente a entrada de hortaliças no interior do terreno. O Inhame exibia sua robustez, enquanto a Abóbora sentia-se orgulhosa em mostrar as suas curvas lisas e definidas.
Os convidados foram chegando e logo adentrando ao terreiro.
Primeiro chegou o Espinafre, seguido da Berinjela, depois a Ervilha, o Cheiro-Verde, que logo foi soltando um aroma peculiar, logo depois veio a Pimenta, que sem querer encostou-se ao Quiabo, causando-lhe uma pequena queimadura, levando-o a ter alguns espasmos e babar-se todinho. A situação foi logo controlada com a chegada do Agrião que, com sua ação refrescante, diminuiu a dor causada pela queimadura. Logo depois veio a Alface que, juntando toda essa meleca, com uma de suas folhas, foi deixar essa sujeira em um lugar reservado.
As horas foram passando e mais convidados chegando. Lá pelo meio dia chegou a Acelga, o Tomate, o Chuchu, o Maxixe e logo depois a Cebola, que teve sua entrada “barrada” pelo Inhame e a Abóbora. A Cebola quis saber o motivo que a levara a ser detida à entrada da festa.
 - Por que não posso adentrar? Sou uma hortaliça. – Afirmou a Cebola!
O Inhame respondeu que estava acatando ordens da organização da festa, e que tinha em mãos a relação dos convidados, e seu nome não constava na lista, portanto, não podia fazer nada a seu favor.
Constrangida, a Cebola afastou-se da fila, que já estava enorme e começou a chorar, exalando um odor muito forte!
Depois desse infeliz episódio, os convidados restantes foram entrando no recinto, a saber: O Pimentão, a Rúcula, o Melão, A Beterraba e o Alho que também foi detido antes de entrar para a festa. Nova confusão. O Alho, todo “roxo” de raiva, começou a soltar um cheiro muito forte e desagradável. Não conformado com a proibição, quis saber quem era o responsável pelo festim e que o mesmo viesse a público e revelar o motivo dessa decisão. A Cebola enxugou as lágrimas e juntando-se ao amigo Alho, ficou aguardando a resposta dos guardiões da entrada.
- Sinto muito, não podemos ir de encontro às ordens dada pela Mostarda, que os retirou da lista de convidados, alegando que o odor exalado por você e a Cebola poderiam prejudicar o evento. - Falou com um embargo na voz a Abóbora.
Os convidados restantes e os que haviam entrado para a festa ficaram revoltados com a decisão tomada pela Mostarda e resolveram todos irem até ao centro da horta onde ela se encontrava situada.
- Mostarda, não está certo você “barrar” a entrada de nossos amigos Cebola e Alho. Nós não nos importamos com o odor que eles soltam, antes de tudo eles são nossos amigos. Qual de nós não tem características próprias? Você, por exemplo, não dá frutos que têm sabor picante, ainda que suave?  Ademais, você, enquanto árvore, não se encaixa na categoria das hortaliças. Seus frutos, estes sim, é que fazem que você possa ser considerada de nossa família, portanto quem não deveria estar aqui, seria você. – Falou a Ervilha, encorajada!
A Mostarda, envergonhada com a absurda decisão tomada, voltou atrás e permitiu a entrada de toda e qualquer hortaliça. Foram tantas que não dava para contar nos dedos das mãos e dos pés!
E a festa continuou com os mais diversos sabores e odores.

 

 

 

 

 
Poema publicado no livro "Data venia!... E tenho dito!" - Contos - Março de 2018