Regulamentos Como publicar Lançamentos Quem somos Edições anteriores Como adquirir Entrevistas
ENTREVISTAS
Entrevistas exclusivas com autores renomados, publicados nas antologias da CBJE nesses 21 anos de existência. Conheça suas histórias, suas obras e veja seus depoimentos.


José Faria Nunes

Quem sou eu
Se me perguntam quem sou, declaro de pronto: um ser humano apaixonado pela vida, pela liberdade, pela natureza, pelas artes em geral e principalmente pela literatura.
Sou americano do Brasil, nascido nas lonjuras do Extremo Sudoeste de Goiás, às margens de uma hoje ameaçada cabeceira de manancial, no município de Cassu.
Professor aposentado e jornalista na ativa, com bacharelado em Direito e em Jornalismo, pela UFG, titulado também com licenciatura plena (Esquema I) pelo Cefet de Belo Horizonte em Direito e Legislação, Legislação Aplicada e Economia e Mercados. Pós graduação com especialização em Psicopedagogia pela UEMG. Maior sonho profissional: poder dedicar-me com prioridade à literatura.

Insatisfação ante as contradições
Meu primeiro trabalho considerado literário foi uma redação escolar quando do curso de Admissão ao Ginásio, em 1967.
Na seqüência, um amor desencontrado motivou-me à escritura de um diário. Daí aos poemas e contos foi questão de tempo, de estudos, de trabalho, mais transpiração que inspiração.
Ao escrever expresso minha insatisfação ante as contradições, as injustiças, o oportunismo, a maior importância que se dá ao ter em vez de ao ser (verbo) e ser (humano). O ato de escrever, portanto, revela-me enquanto ser pensante, sujeito fragilizado diante de um capitalismo selvagem, de um “humanismo” nada humano, demagógico, hipócrita, inconseqüente, que vê no “outro” apenas “meio”, figurante das próprias histórias, nunca protagonistas. Objeto, nunca sujeito.
Arte, para mim, é expressão do autor e de quem com ele, consciente ou inconscientemente, se identifica. Pode ser a expressão de um grito de dor preso na garganta mas pode também ser a expressão de gozo infinito. Depende das circunstâncias pessoais ou geográficas em que se encontra o autor ou o apreciador da obra.

Relação complexa
Minha relação com minha obra é complexa. Como disse acima com respeito à arte, consciente ou inconscientemente, identifico-me com minha obra. A depender das circunstâncias pessoais ou inter-pessoais e das condições do meio ou do momento, minha obra pode ser a expressão de desabafo, de anseio, um grito de dor preso na garganta. Mas também a expressão de alegria máxima, prazer intenso.
Minha produção depende das circunstâncias pessoais ou geográficas em que me encontro ao escrever. Por “circunstância geográfica” leia-se “circunstância do meio”, seja de meu habitat ou do habitat de qualquer ser humano, onde quer que esteja.
Minha obra tem a pretensão de contribuir, ainda que com migalhas, para levar o leitor à reflexão sobre o enfoque abordado. Eu próprio, ao escrever ou ao reler meu escrito, reflito e me posiciono, a favor ou contra a atitude de determinada personagem, real ou fictícia.
Escrevo sobre o que sinto, o que assisto, o que sonho, o que testemunho, o que imagino.
Ainda que admita a idéia da arte pela arte, prefiro uma arte que leve o leitor à reflexão.

Autores goianos
Gosto de diversos autores, entre eles diversos goianos. Para ser menos exaustivo, na ficção citaria José J. Veiga (a hora dos ruminantes), Graciliano Ramos (angústia), Luiz Vilela (tremor de terra) e Miguel Jorge (veias e vinho). Na poesia, Gilberto Mendonça Teles, Drumond de Andrade, Pablo Neruda.

A CBJE
Conheci a CBJE em uma busca aleatória sobre editoras que publicam antologias e gostei de sua política editorial. Aprovei de pronto a idéia da publicação do texto (inicialmente poemas, depois também contos e crônicas) mediante seleção da editora.
Publicação como o Panorama Literário Brasileiro, com os critérios que são adotados pela CBJE, enriquece o acervo literário brasileiro e dignifica o autor.

Aos novos autores
Entendo que, para se tornar escritor, primeiramente necessita-se ser leitor. Se tiver muito tempo disponível, ler tudo que cair às mãos, desde almanaques e gibis, até obras de autores consagrados, obras de referência. Ler obras literárias dos autores conhecidos mas procurar conhecer também novos autores. Reporto-me às palavras do professor Jerônimo Geraldo de Queirós no curso de Direito na UFG: “quem sabe só Direito nem Direito sabe”. É válido lermos obras que nos proporcionem conhecimentos específicos mas também gerais. Se o tempo for exíguo, aí então necessita-se priorizar as leituras. Ler o que for mais representativo, mesmo que não só os clássicos, mas também eles. O candidato a escritor deve ser também observador de seu meio e de seu tempo. E, por fim, meter a mão na massa. Escrever. Reescrever. Reescrever de novo. E com atenção. Pequenos descuidos nos trazem dissabores, contrariedades às vezes irreversíveis. Principalmente depois que o texto for publicado. Nesse particular, antes da publicação, deve-se fazer uma criteriosa revisão. E, para isso, importante é também conhecer o idioma em que forem escritos os textos, em nosso caso a Língua Portuguesa. Temos compromisso com o leitor. Devemos ajudá-lo a nos entender. Ainda que ele nos leia e nos interprete de acordo com suas experiências e circunstâncias, devemos ser facilitadores e não complicadores no entendimento do que pretendemos expressar. Ainda assim, mais das vezes somos incompreendidos, até porque, de acordo com um adágio popular, “quem conta um conto aumenta um ponto”. Aumenta ou subtrai? Ou modifica? Ou complementa? De qualquer forma, a palavra final e o entendimento final é do leitor. Não do autor.
...

Nos lares com maior consciência cultural, nas escolas de todos os níveis, nos institutos, nas academias e em outras instituições e órgãos culturais ou de pesquisa têm-se na leitura, em maior ou menor intensidade, relevante suporte de formação e informação. Não só as leituras de natureza técnico-científica mas também as leituras de obras literárias propriamente dita. Tanto que, em situações diversas ou adversas, tem-se dito que “quem não lê, mal ouve, mal fala, mal vê”.
O hábito da leitura, embora propagado nos discursos, carece de ser mais valorizado na prática e o local mais apropriado para essa prática é a escola. Em todos os níveis, principalmente nos cursos básicos, onde se aprofunda (ou deveria se aprofundar) a preparação do cidadão para vida e para o mundo (vida e mundo do próprio cidadão e de suas respectivas comunidades).
Fala-se que o brasileiro não lê. Ou lê pouco. Verdade discutível mas que deve ser levada em conta. Daí as considerações seguintes.
Necessário se faz que o processo de produção dos livros possibilite o produto final “livro” acessível também ao leitor de baixa renda. Uma política editorial, com maior incentivo dos governos (municipais, estaduais e federais) talvez fosse a melhor opção. Porém não basta produzir o livro. Imperioso é levar esse livro ao leitor e, nesse ponto, falta também uma política eficaz de distribuição. Somente as grandes editoras e os autores já consagrados pela mídia têm o privilégio de ampla circulação.
A solução para esse problema talvez pudesse ser uma parceria governamental de apoio não só à publicação mas também de distribuição do livro. Não com protecionismo em face ao tráfico de influência política ou econômica, mas de forma criteriosa, democrática, levando-se em conta mais que mera quantidade, mas também qualidade. Qualidade, sobretudo, de conteúdo, não necessariamente qualidade de edições de luxo. O livro pode e deve ser um produto popular, ainda que devesse ser livre a publicação de obras de qualidade tal que proporcionasse o acesso do produto brasileiro “livro” também a toa a CPLP-Comunidade de Países de Língua Portuguesa.
Às escolas também cabe parte da responsabilidade pela leitura, não só dos clássicos ou dos famosos, mas também de obras de escritores novos. Cada escola deveria ter sua biblioteca e cada biblioteca deveria oferecer reais condições de acesso ao livro e à leitura. As escolas deveriam levar os escritores de suas regiões e de seus Estados para falar com os alunos. Os escritores, por certo, não rejeitariam convites nesse sentido.
Para concluir, reitero o dístico: “quem não lê, mal ouve, mal fala, mal lê”. E a responsabilidade pela leitura é de todos: pais, alunos, professores, autoridades educacionais, lideranças políticas, administrativas, empresariais e culturais.

Contato:edircom@uol.com.br