Lionizia Goyá
Caçu / GO

 

 

Quandefé

                

Nun tô dano conta de tanta vontade de contá uma coisa procê!!!
Meu um terço goiano “gotiqueju”.
Meu um terço mineiro ama queju, uai.
Il mio terzo italiano apprezzare il formaggio.
Bão bisurdo! Chega dói esse trem.

Pode parecer estranho. Mas o goiano e o mineiro têm um jeito todo especial ao falar. A comunicação deles é exclusiva. Em certos casos muito parecida. E confesso, sou tudo isso misturado. Metade de minha vida habitei nestes dois estados do Brasil – região do típico Cerrado. Portanto, esta forma única de articular as palavras faz parte do meu vocabulário.
Quando casei, ganhei de presente dois adolescentes. Cidadãos de terras distantes.  Hoje, adultos. Filhos de coração! Com suas famílias. Esposos e filhos. Desta convivência, recebi, também, nova língua em meu lar – o Italiano. Novo aprendizado. Grandes paixões. Novos paladares. Sabores maravilhosos! Goiano, mineiro, italiano... Brasil, Itália.
Descobri, neste percorrer, a existência de uma Itália em mim. Internalizada pela delicadeza de uma paixão infindável. Peculiar. Particular. Maravilhosa. Compartilhamos o mesmo gosto por um alimento saboroso. Nutritivo. Tido, há vários séculos, como um alimento muito importante no mundo. Existe uma centena de tipos. Que diferem de aparência, consistência e paladar. Mas especiais em sua individualidade. Únicos. Que amo, sem distinção! De cabra, vaca, ovelha e búfala. Frescos, tenros, semicurados, curados, velhos e envelhecidos.
Fui criada na fazenda. Interior de Goiás. Lugar aconchegante, de gente simples e trabalhadora. Que tira da terra o seu sustento. Sem muito invento, segue os ensinamentos dos seus antepassados. E tem na comida um de seus maiores tesouros.
Com vinte e poucos anos, mudei-me para Uberlândia, Triângulo Mineiro, para estudar. São aproximadamente trezentos e cinquenta quilômetros que separam as duas cidades - É um “logo ali”, de mineiro espichando o beiço.  Mas, como citado, mantemos praticamente as mesmas tradições, principalmente na cozinha.
De minha infância, até os dias de hoje, sempre ouvi dizer que somos a mistura de várias culturas. Múltiplas: indígena, africana e europeia. Do conhecimento indígena aprendemos a cultivar a mandioca.  Aproveitando suas iguarias: bolo, bom-bocado e a farinha. Da africana, os negros trouxeram os gostos de sua terra. Na época, vergonhosamente feitos escravos, comiam as sobras que os “senhores” os destinavam. E a cozinha se alargava na senzala. Pratos maravilhosos eram criados: feijoada, angu, mingau e pamonha. Da cultura europeia recebemos o pão, os doces, os vinhos e o queijo...
Ah! O queijo! Hoje quero falar desta iguaria em particular. Por onde vamos ou passamos, goiano e/ou mineiro, somos relacionados a esta guloseima. Atrevo a dizer, o Italiano igualmente.
Anos de convivência fraterna. Amizade. Carinho e respeito. Algumas brigas e desavenças, mas, uma família feliz! Um trio de irmãos. O varão, Gustavo, formou-se em engenharia, como o pai. Hoje toca a empresa de caldeiras. Presenteou-nos com a primeira neta: Nicole. A pequena Laura, “rapa do tacho”, cursando o ensino fundamental, faz piano no Conservatório de Música local. A mais velha terminou a Graduação, e logo o Mestrado. Para estudar um pouco mais, o Doutorado, nova transformação. Mudou-se para uma cidade antiquíssima. Província belíssima - no coração da Itália – Siena.
Neste ponto uni os três mundos! O que parecia absurdo, não existe mais! A distância colocada, por hora marcada, foi afastada, teve um fim. Houve uma apresentação. Minha paixão: o queijo de um vilarejo, lugar de aconchego, mais uma vez, chegou até mim.
Primeiro - da Serra do Baú, município de Caçu-GO. Onde até a porteira tem um ranger diferente. Encontramos o Queijo Frescal, que absorvo vorazmente.  Lembra minha infância. Período de festança e muita fartura. Feito com leite de vaca, cru, sem pasteurização. Trazendo para o seu interior a flora microbiana única da região. Sem contar a pastagem peculiar daquele lugar.
Segundo - do município de Sacramento-MG. Berço da civilização do Brasil Central. De natureza fenomenal. Com a Gruta dos Palhares, beleza sem igual. Na Fazenda Caxambu, encontramos o melhor queijo de vaca do menu. O premiado da região. Senzala – Queijo Minas Artesanal.  Tradição da família Leite, que produz este nobre deleite! E não tenho medo. Posso afirmar: é dos deuses a se enredar!  
Terceiro - Comuna de Pienza. Vilarejo no alto de uma colina na região de Toscana. Ao sul de Siena. A cidade do queijo de ovelha – o Pecorino. De sabor peculiar! A essência está na própria pastagem dos animais – “Crete Senesi”. Por sua mistura de ervas aromáticas, tomilho selvagem, a segurelha e o hortelã, influem diretamente na fragrância do queijo... haja segredo!
Que fique claro. Não sou queijóloga não estudo queijos. Sou apenas um ser que ama queijo, aprecia o queijo, portanto, sou simplesmente queijófila. Goiano, Mineiro e/ou Italiano, afirmo sempre, gosto muito de todos os “tipos” de queijos!

Bão demais da conta, sô!                                                   
Vai um quejim, aí?

 

 

 

 
 
Publicado no Livro "É tão verdade que ninguém duvida..." - Edição 2019 - Junho de 2019