Denise Pinheiro Mourão
Rio de Janeiro / RJ

 

 

A barca fantasma

                

       

       

 - Conta-se que na Vila da Barca, todo fim de mês, ao final da noite, em dias bastantes movimentados, ocorrendo o período do remanso, as mulheres da noite iam para a beirada da prainha esperar os barcos, para concretizar a viagem do amor. Escolhiam a área das pedrinhas (hoje próximo ao Curro Velho)  para aguardar os seus pretendentes.
Passavam o dia inteiro  a se arrumar , como se fosse a primeira vez que iriam se dar ao deleite dos prazeres da carne. Viviam a esticar cabelos, colar cílios, testar cor de maquiagem, troca de lingeries , vestidos , escolha de acessórios, escolha de esmaltes e batons. Uma riqueza de detalhes para quem tinha tão pouco para investir no quesito sensualidade.
Era uma história de:- me empresta, -devolve, -tá doida, - é minha! Não raro havia troca de puxões de cabelos e de palavrões e maldições! Era uma ansiedade geral , todas queriam se produzir ao máximo, para garantir uma noite produtiva. Pois quem assistia esse burburinho pensava que era um concurso das damas da noite. E ficavam sonhando , conjunturando as possibilidades de ganho e lucro, as vezes trabalhavam a noite toda , para ganhar mínimo cachê,  mas para muitas que já não eram tão jovens , e estavam sem atrativos da beleza, o importante era participar dessa tão esperada aventura do amor.
  Acontece, que várias vezes uma barca misteriosa, linda, enfeitada de luzes e bandeirolas brancas, chegava ofuscando as belas mulheres. Conta-se que escutava-se um som. - Era uma linda música, e não se via o nome da barca, e as damas comemoravam, batiam palmas, pulavam assoviavam, e  gritavam Aqui! Aqui! Pensando ser aquela a barca ideal para o passeio amoroso.
De longe vislumbravam festa animada com mesas de comidas e bebidas. Avistavam os marinheiros lindos, um mais forte que o outro, os uniformes alvos, os olhares brilhantes, sorriso perfeitos, acenando para elas, e chamado as para seus braços.  Elas ficaram afoitas para embarcar, queriam participar da festa, jogam uma escadinha vão subindo uma a uma, e no meio da subida alguém diz:
- Olha quem ta lá a Maricotinha;
Mas alguém despertava daquele estupor e gritava , Maricotinha já morreu há mais de dez anos, é uma barca fantasma!!!  Eram gritos desesperados, as mulheres ficavam em pavorosa... E quando menos esperavam, a barca ia se dissolvendo na visão de todos, se transformando em um fumaçal e nada mais se via da mesma. As mulheres assustadas pulavam n’àgua, algumas largavam seus pertences; bolsas e sapatos, acessórios do cabelo etc... Era um desespero, cenas de filmes de terror, e os marinheiros antes lindos e vigorosos, transformavam se em espectros horríveis de gargalhada zombeteira e infernal.
Para salvarem se e na ânsia de mergulhar na Baía do Guajará, elas chegavam sôfregas à prainha, e num choro incontido, faziam suas rezas e invocavam seus santos. Algumas desmaiadas, precisaram ser carregadas pelos bêbados da beira da ponte, que indagavam lhes: - o que tinha acontecido?
Quando voltavam na ponte, molhadas, desmaquiadas, sem sapato, bolsas... Levaram uma vaia dos moradores, que sorriam da desventura das mesmas. E assim mais uma vez, era efetivada a lenda da Barca Fantasma.
 


 

 

 

 
 
Publicado no Livro "É tão verdade que ninguém duvida..." - Edição 2019 - Junho de 2019