Rozelene Furtado de Lima
Teresópolis / RJ





A calça jeans



      As hortênsias têm uma roupagem criada para elas, em modelo e cor como todas as plantas. “Olhai os lírios do campo...” Mas nós gostamos de variar com a moda, fazer parte do bando. Integrar-se.   Tem pessoas que  adaptam-se a um estilo e usam sempre.  Aqueles que estão mais tempo por aqui, com o passar dos anos e a sabedoria adquirida, não se importam mais com a moda, vestem-se confortavelmente e basta. 
      A melhor amiga de Frida foi viajar, viagem internacional. – Que é que você quer de presente? – Perguntou a amiga.  Frida sonhava com uma calça jeans de uma marca, que estava em moda, e que só era vendida em certo grupo de lojas americanas. Sem pensar pediu a tal calça. Pode comprar que eu pago, respondeu Frida. 
      A amiga voltou seis meses depois, pois tinha ido fazer um curso de especialização. Chegada radiante, muitos abraços e beijos, depois de uma quantidade de saudades mortas, a viajante abriu as malas e distribuiu os presentes. Frida agarrou a calça dos sonhos com toda força e sorrindo agradeceu feliz.  
      Mais tarde, em casa, Frida foi vestir a calça. Puxa daqui, estica de lá, abaixa a coluna, deita na cama com as pernas para cima, e nada. A calça não passou dos joelhos, não cabia nem na imaginação. Veio o choro, a angústia desesperada embalada pela decepção. Passado algumas horas ela tomou uma decisão: - esta calça é minha, foi comprada para mim e eu vou usá-la de qualquer jeito. 
       Foi a uma nutricionista e começou severamente a botar em prática o projeto alimentar. Emagrecer dez quilos em um mês. Sofreu, ficou com muita fome, resistiu aos ataques da gulodice, fez rezas, mudou os hábitos e tudo e muito mais que a orientação profissional permitiu a Frida poder alcançar o objetivo de mudar o corpo. Também exercícios físicos duas vezes por dia evitando assim perder massa muscular. 
      A linda calça estava no cabide no closet, todos os dias ela pegava o cabide, falava com a calça: você vai ter uma surpresa. E colocava a calça de volta no armário. Este ritual Frida fazia todos os dias. Entretanto nunca se atreveu experimentar a calça, mantendo a esperança de vestir a calça elegantemente. 
      Ela conseguia esquecer a dieta alimentar quando passeava com seu cão. Um Pastor Alemão, que veio bebê e agora já tinha um ano e pouco.  Ela amava o cão e o cão a amava. Onde ela estivesse o cão estava e quando ela saía ele ficava aguardando no portão. 
      Faltavam três dias para o aniversário da melhor amiga que havia trazido a calça do estrangeiro. O corpo de Frida afinava a cada dia um pouquinho. As pessoas que a conheciam perguntavam se ela estava doente, ao que ela respondia: Não, é muito trabalho e estudo. Por incrível que pareça ela não tentou vestir a calça nem uma vez. Decidiu que só experimentaria na hora de ir para a festa. 
      Enfim chegou o grande dia! À noite Frida vestiria a calça e dançaria muito.  
      Prontinha, maquiada, penteada, hora de vestir a sonhada calça.  O que? A calça não estava lá no lugar no armário. Tinha cumprido o ritual de falar com a calça pela manhã.  Cadê você calça, onde você está? A calça já tinha se tornado uma atriz no desenrolar do teatro da vida da moça, de tanto que ela dialogou com a calça americana e até conversava em inglês. 
       Mãeeeeeeeee... você viu uma calça que estava aqui?  A mãe de Frida muito gentilmente respondeu: - Você não notou que hoje eu arrumei seus armários? Tirei tudo que estava velho e roupas que você nunca usou. Mãe eu só quero uma calça jeans que Iná trouxe para mim dos Estados Unidos. Aquela que você nem gostou, nunca vestiu? Foi a primeira que tirei do cabide e botei no varal para arejar, porque estava com cheiro forte de nova.  
      – Tá, então pega para mim, por favor, que já estou atrasada. 
      A mãe volta chorando com um trapo na mão, uma lembrança de calça. A peça estava completamente rasgada, destruída. Nada poderia ser aproveitado, nem para fazer pano de chão até o fecho-eclair estava dependurado. 
     -  Que foi que aconteceu com a minha calça? Perguntou Frida aos pulos gritando aos prantos. 
    - Apolo puxou as pernas da calça do varal e estava agora dormindo por cima dela, ele rosnou para mim quando puxei para pegar. Não sei o porquê de ele fazer isto, não tem explicação. 

 

 


 




Conto publicado no livro "Fato ou ficção?" - Contos selecionados
Edição Especial - Setembro de 2020

Visitei a Antologia on line da CBJE e estou recomendando a você.
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