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Bianca Danielle Galvão Pinheiro
Curitiba / PR

 

  Superstições

 

   

 Margareth ou Maggie, como prefere ser chamada, foi uma criança com uma imaginação muito fértil, nem imaginava as situações que sua mente criativa a levariam um dia. Cresceu em uma família pequena e passava a maior parte do seu tempo com a avó, uma mulher que viajou o mundo quando jovem e que sempre adorou lhe contar suas histórias e aventuras, por ser uma mulher espirituosa, sua avó Janete, tinha crenças fortes, como em superstições, sempre dizia que eram coisas reais e que acreditar nelas sempre a tornou mais forte.
Hoje, Maggie com seus vinte e sete anos já não se recorda muito bem de todas aquelas velhas histórias e superstições que passou tantas tardes na infância ouvindo atentamente, a imaginação que borbulhava ao menor sinal foi engavetada junto com as ideias de mudar o mundo.
Naquela manhã de domingo, ao acordar para sua corrida matinal, percebe três ligações perdidas da sua mãe, ela tem uma péssima mania de deixar seu celular no modo silencioso, retorna então o contato e recebe a triste notícia do falecimento da sua querida avó Janete.
Desorientada e chorosa, pega várias peças de roupa de seu armário e as joga de qualquer jeito em sua mala de viagens, olha para a foto que tem presa no seu espelho das duas, sua avó e ela sorrindo, sentadas na cadeira do velho balanço que fica no jardim da enorme casa em que cresceu, sente uma vontade enorme de falar com a avó uma ultima vez, para despedir-se. Sem pensar muito, pega seu carro e vai rumo a cidadezinha que cresceu.
Depois de quatro horas de viagem, Maggie chega em seu destino e no trajeto até a casa de sua avó, começa a reconhecer rostos por onde passa, já que passou toda sua infância naquelas ruas.
É meia noite quando termina de se despedir de amigos, parentes e vizinhos que vieram prestar sua solidariedade, então sai para andar no incrível jardim que Janete cultivava com tanto amor, e foi para o seu lugar preferido no mundo, o canto do balanço, lugar que trocou segredos com Mari, sua prima preferida, onde sempre corria para chorar sozinha quando algo dava errado, e comemorava suas vitórias, ali também era um lugar cheio de memórias de sua avó, foram naqueles velhos balanços em que ouvira tantas histórias, todas contadas com um bom humor que refletia nos olhos de Janete.
Ali, deitada no gramado, lágrimas rolaram de seus olhos, recordou algumas superstições que sua avó contava para assustá-la quando criança. Como a que se apontasse para uma estrela com o indicador direito, uma verruga nasceria na ponta do dedo. Ao abrir seus olhos, Maggie viu o céu estrelado e sozinha perguntou-se quando começaria a chuva, pois nos filmes em que assistiu, sempre chove em velórios. Então, começou a apontar as estrelas, uma a uma, desejando com todas as forças sentir a presença de sua avó. Um pouco depois disso levantou-se e foi se deitar, teria um dia cheio amanhã, e ela nem imaginava como.
É umas sete da manha quando ela acorda com o choro de um bebê, tenta se lembrar quem tem um bebê na família, mas desiste, há muito não se interessa por seus parentes distantes. Ao coçar seu olho para limpá-lo ela sente algo áspero em seu dedo, e demora uns instantes pra perceber que é uma verruga, pequena, mas que com certeza não estava lá quando ela deitou para descansar. Ela então lembra-se da superstição, e desconfia que a verruga é fruto de seu ato da noite anterior e não sabe se isso a deixa animada ou preocupada.
Quando abre a porta da casa para ir á igreja em que todos estão reunidos, vê a chuva que enfim apareceu. Pega um guarda-chuva no armário de coisas uteis, como Janete o chamava, e escolhe um para acompanhá-la, no momento em que aperta o botão de abrir ouve as palavras de sua avó “Abrir guarda-chuva dentro de casa atrai azar”, sente um arrepio nas costas e sai para a manhã fria.
Maggie sofre um pouco para abrir o portãozinho de madeira que da para a rua e quando consegue perde o equilíbrio e cai, com os joelhos e braços afundando na poça d’água e molhando-se toda na lama fresca, o vento vem forte e entorta seu guarda-chuva, o deixando desfigurado.  Ela corre de volta para dentro da casa e liga para sua mãe que deve chegar em algumas horas na pequena cidade. Após relatar os acontecimentos, a mãe ri, e diz que isso seria típico da Srª. Janete, assombrar a neta com suas superstições no dia de seu velório. Enquanto estão no telefone, Maggie se acalma e começa a pensar que se essas coisas estão realmente acontecendo por alguma força do universo, que era como sua avó as descrevia, ela pode lidar com isso, desde que sinta a presença de Janete, ela aguentaria o que fosse.
Quando esta para sair de casa novamente, ouve um raio causado pela tempestade, e sem pensar duas vezes corre para cobrir o enorme espelho da sala de estar, mas nesse momento as luzes se apagam, e o espelho parece brilhar, por um momento Maggie pensa se realmente acordou ou se esta sonhando, pois ela vê a figura de sua avó, perfeita, refletida no espelho, a imagem não diz nada, apenas sorri e aponta para o velho armário de coisas uteis. Depressa, Maggie abre o armário e vê que no local onde estava o guarda-chuva que pegou minutos antes, há um pequeno diário. Assim que o tem em mãos volta sua atenção para o grande espelho, mas não há mais nada ali e ela entende que aquele diário era um presente deixado por sua avó.
No diário, além de historias e relatos de suas próprias aventuras, Janete deixou um roteiro que devia ser seguido por sua neta, para leva-la a desvendar os segredos das superstições e o porquê de sua avó sempre ter acreditado nelas com tanta devoção.
Maggie não fazia a mínima ideia de onde estava entrando, mas sentiu um forte aperto no peito, um entusiasmo que há anos dormia em seu corpo, e sem pensar nas consequências, pegou sua mala de viagens, colocou seus medos no bolso e seguiu, rumo ao desconhecido.

 

 
 
Conto publicado no "Histórias (incríveis) da meia-noite" - dezembro de 2016