Claudia Fontenele Alves da Silva
Águas Claras / DF

 

Ídolos de concreto

 

     

               A vida é repleta de paradoxos. Basta estar vivo para ser entrelaçado nas idas e vindas que a vida nos oferece.
                Sempre fui amante da natureza. Gosto de apreciar o céu ensolarado. Adoro aspirar o perfume das flores no campo. Ouvir a algazarra dos cães correndo atrás das galinhas no quintal. Tomar banho no riacho e, depois, ficar deitada na toalha, encima da relva verdejante, olhando as nuvens. Tudo isto é maravilhoso! Faz com que me recorde do Criador. Entretanto, a vida teve que tomar um novo rumo.
                Com a morte inesperada dos meus pais, fui forçada a abandonar a minha pacata vidinha na fazenda. Tive que deixar meu pedacinho do céu. Tive que sair da minha terra querida. Meu pedacinho do céu ficou em terras longínquas.
                Aventurei-me pelas estradas tortuosas que o destino me ofereceu. Acabei fazendo pousada em uma nova cidade.
                No princípio, tudo era novidade. As grandes estruturas de ferro e concreto absorveram minha atenção, bem como a correria das pessoas em seus afazeres cotidianos. Fiquei maravilhada com a arquitetura inovadora. Pouquíssimas casas, mas havia uma infinidade de edifícios.
                Eu mesma fui morar em um edifício altíssimo. Dele, era capaz de avistar o horizonte pela janela da sala. Via as casas a certa distância; enxergava os carros a trafegar pelas ruas. Tudo sempre muito movimentado e barulhento.
                Indaguei-me se seria capaz de me adaptar à nova realidade? Somente o tempo seria capaz de dizer.
                À noite, percebi assustada que as luzes nunca se apagavam lá fora. O céu não era tão limpo. Uma névoa pairava nele. O que via, de fato, era a agitação constante. Barulho e frenesi nas ruas. Precisaria me acostumar com essa realidade.
                Os dias foram transcorrendo. Fui me acostumando com o barulho dos carros; fui me acostumando com a correria das pessoas. Confesso, porém, que ainda não me acostumei é com a indiferença que reina nessa selva de pedra.
                As pessoas dão bom dia para você, mas elas não têm tempo para ouvir a sua resposta. Elas falam pelas redes sociais; dizem ter muitos conhecidos e amigos; mostram sorrisos e, aparentemente, parecem felizes e satisfeitas com a vida que levam.
 Os que deveriam ouvir você fingem que estão ouvindo, quando na verdade eles estão preocupados com suas próprias vidas.
                A indiferença reina na selva de pedra. Há muitas pessoas conectadas via internet, mas que não sabem mais sorrir e dialogar ao vivo e a cores. Tornaram-se automatizadas. Fazem caras e bocas de contentamento, enquanto reina um profundo vazio nos relacionamentos.
                Olhando pela janela, as luzes piscam lá fora. Eu me pego recordando a minha vida lá do interior.
                As pessoas tinham tempo de conversar. As pessoas se ajudavam mutuamente. Ninguém necessitava aparentar o que não era. As fotos nos álbuns de família falavam de coisas reais; falavam de sentimentos vividos, de experiências reais, do aconchego entre famílias e amigos.
                As estruturas de concreto, tão imponentes, ainda chamam minha atenção. O que me deixa entristecida é saber que o coração das pessoas está abarrotado de ídolos de concreto. Ídolos imponentes que separam as pessoas umas das outras.
                Os ídolos se instalaram sutilmente nas vidas. Alegando que estão em busca de uma melhor qualidade de vida, as pessoas se desumanizaram. Elas deixaram de amar as pessoas para amar as coisas. Desaprenderam a olhar nos olhos uns dos outros. Corromperam-se com a ilusão do sistema capitalista, onde o ter é mais importante que o ser.
 A concupiscência da carne, a concupiscência dos olhos e a soberba da vida são gritantes nesta selva de pedra. Entre os arranha-céus não há espaço para jardins silenciosos, onde as pessoas possam contemplar o céu estrelado; onde pessoas possam apreciar a obra do Criador. As pessoas correm em busca de segurança e estabilidade. Para isto, elas se fecham em seus escritórios e, quando exercem uma profissão ao ar livre, nunca tem tempo de apreciar a natureza. Elas investem todo o tempo que lhes é oferecido em atividades que satisfaçam sua fome de poder, status, prazer, e aceitação. Esqueceram-se, porém, que nada pode preencher o vazio de suas almas que não seja o próprio Deus.
Meu Deus! Que eu não seja engolida pelo sistema. Que minha vida não se resuma a ser argamassa. Que os ídolos do concreto frio e cinza não se sobreponham ao amor que tenho por Ti.
Embora fascinada pela vida nesta cidade grande, o que desejo, de fato, é voltar para o meu pedacinho do céu. Mesmo sabendo que, o meu pedacinho do céu fique em terras longínquas, não desanimo não. Vou caminhando pela estrada da santificação. De Deus, não abro mão.

 

 
 
Publicado no Livro "O Jogo da Vida" - Edição 2018 - Outubro de 2018