Otaviano Maciel de Alencar Filho
Fortaleza / CE

 

O chute que deu errado!

 

               

Logo que os primeiros raios de sol surgiram, Beto, um garoto aficionado por futebol, acordou e imediatamente foi fazer a higiene matinal e tomar o café da manhã. Estava ansioso, pois a semifinal de partida do campeonato de futebol interbairro iria ser realizada logo mais em breve, por volta das oito horas e ele fazia parte de um dos times que conseguira chegar a final. Beto era o goleiro do time da casa. Pegou as chuteiras, a camisa esportiva do seu time e caminhou imediatamente até o campo de areia que ficava próximo de sua residência. Ao chegar cumprimentou os amigos e tratou logo de vestir a camisa e calçar as chuteiras, pois os outros jogadores já estavam todos paramentados e prontos para, antes do jogo, fazerem um rápido treino.
O jogo teve seu inicio adiado, pois o árbitro que iria apitar a partida ainda não havia chegado. De certa forma foi até bom porque os times tiveram mais alguns minutos para repassarem alguns chutes ao gol.
Eram oito horas e vinte cinco minutos quando aparece o Valdo, o juiz da partida, meio cambaleante, dirigiu-se ao centro do campo para dar início à competição.
Contudo, antes de narrar o jogo e o que aconteceu durante o bate-bola, vamos saber um pouco mais sobre o Sr. Valdo: Mário Osvaldo Quintino - ou simplesmente Valdo - era um homem de meia idade que tinha a fama de briguento. Andava sempre com uma faca na cintura, sabe Deus pra quê! Também gostava de dar uns tragos no álcool: e que tragos! Quase todos os dias, encontrava-se embriagado. Era criador de pássaros e tinha várias espécies nas diversas gaiolas dependuradas na parede de frente de sua casa e viveiros que ele mantinha no interior de sua residência, que ficava em frente ao campo onde se realizava o campeonato. Seu filho Arthur também era jogador do mesmo time do Beto. Agora já sabemos o motivo do juiz ter se atrasado e chegado cambaleando no local do jogo, vamos, então, saber o que aconteceu durante a partida de futebol.
O árbitro apitou o início da partida e os jogadores começaram a se movimentarem, passando a bola uns para os outros. Chute vai, chute vem e após alguns minutos de gritos e palavrões proferidos, o placar ainda indicava zero a zero. O Juiz, “mais suado que tampa de chaleira”, de tanto correr de um lado para o outro do campo, parecia que ia desmaiar de tanto cansaço.
Os torcedores que se encontravam sentados em pequenos bancos feitos de madeiras em um dos lados do campo, gritavam e tentavam encorajar os seus times a fazerem a rede balançar: se bem que as redes que estavam nas traves, iriam arrebentar quando uma bola entrasse no gol, de tão velhas que eram!
O primeiro tempo do jogo terminou em zero a zero. Valdo aproveitou o intervalo e foi colocar água, ração e algumas frutas para um casal de graúnas que estava dentro de uma das gaiolas penduradas defronte sua residência, enquanto a garotada descansava para o segundo tempo do jogo.
Depois de vinte minutos começou o segundo tempo do jogo. Os atacantes estavam determinados a fazerem pelo menos um gol e vários chutes foram dados na direção das traves de cada adversário. O time visitante atacava cada vez mais e o seu “ponta direita”, “escapulindo” pelos lados, conseguiu chegar até a grande área e soltar uma “bomba”, que resvalou no travessão superior do time da casa. O juiz apitou tiro de meta e Beto, o goleiro, de posse da bola, fez um lançamento para o lateral esquerdo, que já se encontrava em posição de ataque. Infelizmente, o lançamento foi forte demais e, passando pelo lateral foi de encontro às pessoas que estavam sentadas na calçada defronte a casa do juiz, indo de encontro à gaiola das graúnas e derrubando-a ao chão, espalhou a ração e as frutas, além da água. Sorte que a porta da gaiola não se abriu!
O juiz, sem se aperceber do ocorrido, apitou cobrança de lateral, mas quando se deu conta do que tinha acontecido, saiu aos berros e, puxando a faca que levava na cintura, foi de encontro a Beto que, quando viu aquele homem vindo em sua direção tirou a camisa e jogou-a junto à trave e tratou de correr para casa, enquanto o filho do juiz agarrava-o dissuadindo-o ao não cometimento um crime. E assim ocorreu, seu filho disse que foi uma fatalidade e que não tinha acontecido nada com as graúnas. Como Beto não voltou, porque provavelmente nessa hora estava escondido, de tanto medo, o goleiro reserva foi substituí-lo. O jogo foi reiniciado, antes, porém, Valdo colocou suas graúnas dentro de casa, para que não acontecesse de ela ser acertada por uma “bolada” novamente!
O jogo terminou e a equipe visitante venceu de um a zero e nova partida foi marcada para o domingo seguinte, no jogo de volta, dessa vez no campo do adversário, localizado no bairro vizinho.
Durante a semana Arthur falou com Beto e o tranquilizou, dizendo que seu pai tinha “perdido a cabeça” naquela hora, mas que estava tudo bem e ele não precisava ter medo e que ele teria de voltar a jogar, pois ele era o goleiro titular e que o time tinha que vencer para poder disputar a grande final em outra data. Beto, ainda assustado disse:
- Eu vou Arthur, desde que o Juiz não seja o Sr. Osvaldo. Ah, tem outra coisa: se tiver gaiolas por perto pode arranjar outro goleiro!
O jogo marcado para o domingo seguinte foi vencido pelo time da casa, que fez dois a um no time adversário, levando o time a disputar o campeonato em nova partida. O jogo da final, marcado para o último domingo do mês, foi disputado nos pênaltis e o time de Beto venceu por três a um, levando a taça de campeão.

 

 
 
Publicado no Livro "O Jogo da Vida" - Edição 2018 - Outubro de 2018