Helena Maria S. Matos Ferreira
Guapimirim / RJ

 

O guia alado

     Tio Antônio era um homem bem apresentável, sempre bem arrumado e elegante, embora não possa dizer que era bonito.
Gostava de jogar sinuca, de ocupar sempre o mesmo lugar à mesa. Se alguém estivesse no “seu lugar”, ele disfarçava, ia e voltava até que alguém discretamente dizia: - “Você está no lugar de Tio Antônio.” E logo a pessoa se levantava. Então, como se nada tivesse acontecido, o velho senhor sentava-se no seu lugar.
Era um bom contador de “causos” e de histórias. Sabia algumas palavras em Alemão, inclusive contar até dez. Um coleguinha lhe ensinara quando criança. Discutia com o cunhado Lilico os sons do z e do s. Pareciam dois gramáticos conceituados. E na realidade eles eram, pois todos nós brasileiros entendemos muito bem a Língua Portuguesa. Era interessante como trocavam a posição dos sons e faziam inúmeros trocadilhos, além de paródias.
Bem, o Tio Antônio gostava de caçar e a Mata Atlântica, bem fechada na região serrana era muito propícia na época de sua juventude. Um dia ele saiu bem cedo de casa com sua velha espingarda, suas botas de cano alto e adentrou a mata. Foi seguindo rastros, perseguindo pássaros e não acertava nenhum, graças a Deus. Tanto se distraiu que enveredou pela mata e não achava o caminho de volta. Perdera o rumo e a trilha. Parecia andar em círculo, pois não encontrava indícios que permitissem encontrar o caminho que o tiraria daquele labirinto. Os micos pulavam nas árvores, o miado de um gato do mato o assombrava e tudo já estava um tanto fantasmagórico. Os últimos raios de sol se esvaíam e o frio aproximava-se doído. Ouvia o barulho de uma cachoeira, mas não conseguia localizá-la. Já estava meio desorientado, sem saber o que fazer e pediu a ajuda dos céus, pois se não conseguisse sair da floresta, provavelmente um animal noturno o atacaria ou quem sabe, uma hipotermia por causa do despreparo de suas roupas. Sentou-se então, por um breve instante, na raiz de uma grande árvore, pensando no perigo das cobras. Rezou uma oração para afastá-las. Como todo caçador, não pronunciava cobra e sim “braco”. Superstição com certeza. Continuou em oração com os olhos fechados e quando os abriu, tudo já estava escuro. Na floresta um breve instante modifica o cenário. Aí então aconteceu o fantástico, extraordinário e inusitado: uma enorme borboleta apareceu-lhe. Muito brilhante, luminosa, do tamanho de uma pomba. Ela voava ao seu redor. O susto foi tão grande que ele rapidamente se pôs de pé. E a borboleta não o deixava. Ia adiante e voltava, como se o estivesse convidando a segui-la. E sua luz intensa mostrava-lhe um caminho. Ele a seguiu e chegou a uma trilha. La ia a sinistra borboleta sempre a sua frente, indicando-lhe um caminho. Por um bom tempo, o jovem caçador seguiu o ser alado, até que finalmente saiu da floresta. Já estava a salvo quando a bendita borboleta deu mais uma volta ao seu redor e desapareceu.
Tio Antônio agradeceu aos céus e nunca mais entrou na mata desprevenido. Descuido só uma vez, pois ajuda celeste não acontece todo dia.


 

 
 
Poema publicado no livro "Painel de Contos Premiados" - Outubro de 2017