Otaviano Maciel de Alencar Filho
Fortaleza / CE

 

 

Mentiras e mais mentiras


 

          Atualmente vemos ordinariamente na imprensa escrita assim como nas mídias digitais, informações que deixam em muito a desejar no que diz respeito à veracidade das mesmas. Não raro somos surpreendidos por notícias fantasiosas, cujo intuito é levar aos desavisados de plantão à cultura da ignorância, já que estes não se dão ao trabalho de investigarem a autenticidade das informações que são veiculadas.
          O mundo como conhecíamos há cerca de trinta anos, não é mais o mesmo. O avanço tecnológico no campo da informação foi marcante nessa mudança de postura do ser humano frente aos novos desafios a serem superados no setor de informação. O contentamento com respostas simples não é mais digerido pela grande massa de indivíduos cada vez mais sequiosos de detalhes nas informações recebidas. Contudo, o fato dessas informações serem, em muitos casos, minuciosas em seus detalhamentos não lhes garante a veracidade. E agora vivemos a era das chamadas “fakes news”, ou simplesmente notícias falsas, que estão presentes em toda parte.
          Há um ditado popular que diz que uma mentira propagada várias vezes com o passar do tempo torna-se uma verdade. E ao que tudo indica esse aforismo ainda perdurará por muito tempo, pois, o ser humano, ao que parece, em muitos casos prefere acreditar em uma mentira que lhe conforte o coração a aceitar uma verdade que lhe venha ferir.
          Lembrei-me de uma citação feita por um colega, quando resenhávamos a respeito do poder daqueles que dispõem de informações relevantes, na ocasião, afirmou que a informação somente será valiosa se o detentor dela for um indivíduo portador de conhecimento, pois somente assim ele saberá utilizá-la e tirar bom proveito, além de não se deixar ser manipulado por pessoas cujo interesse maior é a propagação de informações falsas. Isso me fez lembrar uma estorinha hilária lida há tempos, cuja fonte me é desconhecida. Permitir-me-ei fazer uma versão: Conta-se que um adestrador de cães descobriu que as pulgas que tanto infernizavam os seus animaizinhos escutavam pelas pequeninas patas, pois observando que ao passar a mão sobre o dorso dos caninos, e separando os pelos bastava gritar “pula pulga” que elas imediatamente saltavam deixando o animal aliviado. Motivado pela tal descoberta resolveu fazer uma experiência em público e provar sua teoria. De posse de algumas pulgas dentro de um vasilhame de vidro e outro vazio foi até uma rua bastante movimentada e montou uma mesinha, e colocando os dois frascos de vidro em cima da mesma começou o espetáculo com várias pessoas parando para vê-lo em ação.
          - Venham todos ver a grande descoberta. As pulgas, diferentes de todos os outros animais, ouvem pelas pernas. - Falava ele, empolgado.
          Após um quarto de hora já havia pessoas suficientes para ele começar a demonstração: De posse de pequena pinça arrancou as patas de algumas pulgas e as colocou no outro recipiente de vidro, agitou o recipiente que tinha pulgas com as patas e mandando-as pular elas saltitavam, com a outra mão chocalhou o vasilhame quem continha as pulgas com as patas decepadas e, pedindo que elas pulassem, constatava-se que as coitadas não saiam do lugar, pois segundo ele elas não pulavam porque não podiam ouvir pelas patas, que agora não estavam mais em seus corpos. Talvez ele tenha convencido alguém de que realmente ele estava com a razão. Outros talvez o tenham visto como um charlatão, outros como um artista fazendo gracinha e ainda outros talvez o tenham visto como um demente.
          É claro que a estorinha é fictícia, mas serve de exemplo, na vida real, para as pessoas que tomando uma informação não se preocupam em averiguar a veracidade e passam a vivenciá-la como verdadeira, e ainda mais quando a difunde atingindo muitas outras pessoas, que como ela, não têm compromisso com o verdadeiro teor da informação.
          O momento em que vivemos é um exemplo prático dessa situação: A pandemia causada pelo corona vírus “caiu como uma luva” nas mãos de seres inescrupulosos que disseminam informações falsas em todos os cantos e recantos, dificultando cada vez mais o controle dessa terrível doença.           Tratamentos esdrúxulos como “água consagrada”, “sementes ungidas”, remédios para piolhos e outros tantos são receitados de forma irresponsável por pessoas que detêm grande poder de influência nas massas populacionais.
          Se o defeito da mentira é ter pernas curtas, eu infelizmente sou levado a crer que ela burla eficientemente essa imperfeição tirando proveito próprio e mantendo conluio com todos aqueles que a têm como uma companheira que vara o tempo sem perspectivas de finitude.
          A mentira em si mesma não é o grande problema, mas os que a utilizam terão que se explicar quando a verdade surgir, porque mesmo de pernas curtas ela dará um grande salto deixando o pobre indivíduo em apuros diante a verdade, pois em qualquer época da humanidade as duas sempre se encontram e o dilema então será: A mentira contada era uma verdade ou a verdade contada era uma mentira, uma meia verdade ou talvez só uma mentirinha?

 

 


 




Conto publicado no livro "Mentiras (mais ou menos) verídicas"
Edição Especial - Agosto de 2021

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