Valdirene de Assunção Pereira
Santa Maria / RS

 

 

 

Eu vou só




Liguei o rádio, estava tocando uma linda canção, "Maracangalha", escrita pelo compositor e cantor baiano, Dorival Caymmi:
"Eu vou pra Maracangalha/ Eu vou/ Eu vou de uniforme branco/ Eu vou/ Eu vou de chapéu de palha/ Eu vou/ Se Anália não quiser ir/ Eu vou só/ Eu vou só...".
Aumentei um pouco o volume, fazia um tempo que eu não escutava Caymmi, gosto muito de suas canções, aproveitei para refletir.
Hoje em dia o uniforme branco, não aquele que Caymmi fez referência na sua canção, mas o uniforme dos médicos, dos enfermeiros, dos técnicos, dos atendente de farmácia, dos açougueiros, dos padeiros, dos responsáveis pela higienização dos lugares, assim como de muitos outros trabalhadores na linha de frente, este é o uniforme ao qual me refiro.
Este uniforme  que o corpo de cada um deles está contido, guardado ali dentro e guardando nossas vidas, ajudando a nos proteger, alimentar e cuidar.
O mesmo corpo, que vive, sorri e chora, que sente a cada minuto uma nova chance de vida, de alegria e de renascimento surgindo no meio ao caos.
Aquele corpo que volta pra casa exausto, que fica feliz ao poder retornar para o seu lar, ver  sua família, seu gato, seu cachorro, ou até mesmo seu quadro preferido na parede, por hora aliviado, suspira: - Este dia eu venci.
A cada um destes corpos dentro do uniforme branco, que nunca foram para "Maracangalha", minha eterna gratidão.
Continuei mais um pouco em minha reflexão e no lugar do "chapéu de palha", visualizei a máscara, hoje não podemos ir em lugar algum sem ela, por amor e respeito ao próximo e por amor e respeito a nós mesmos.
A máscara que antes do novo normal, todos diziam, que muitos deveriam tirar a máscara ou deixar a máscara cair, e a máscara para muitos não caiu, nem a "ficha" ainda não caiu, muitos não perceberam que tudo está mudando, ou deveria estar mudando.
Mudando nossos conceitos, nossa visão de mundo. Está nos sendo dada uma chance de  olhar o mundo com outros olhos.
A máscara, virou nosso escudo, nosso capacete, nossa proteção, e pedimos a todos, o tempo todo, a todo o custo, usem a máscara, por amor, por favor.
O sorriso agora, é visto no olhar. E este olhar que aprendeu a sorrir, este vai ser o olhar que vai ver o mundo de outra forma.
E continuei viajando na música, um clássico, mas para o meu momento tão real, e continuei meu pensando, não vou convidar a "Anália", "eu vou só".
Devemos evitar aglomerações.
Mesmo que ela quisesse ir, eu pediria que ela ficasse, não é o momento para passeios. Se puder fique em casa. Depois que tudo isso passar, que a vacina chegar, podemos ir todos juntos, em todos os lugares, sem máscaras. Agora ainda não.
"Eu vou só".

 

 

 





Conto publicado no "Livro de Ouro do Conto Brasileiro"
Edição Especial - Outubro de 2020

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