Romilton Batista de Oliveira
Itabuna / BA

 

 

 

Por trás das palavras

 

Um dia, me disseram, que as palavras são feitas de perdas. Lembro-me das palavras ditas pelo entregador de pizzas que, rapidamente, entregava a encomenda e dizia do nada: “As palavras são feitas de perdas!”.
Sempre aos domingos costumava pedir pizzas de camarão e passava o dia todo na varanda de meu apartamento naquela pequena silenciosa cidade portuguesa.
Passados alguns meses, percebi que uma nova pessoa estava a entregar a pizza. E, como já estava acostumado com a repetida frase “As palavras são feitas de perdas!”, perguntei ao novo entregador:
- A pizzaria mudou de despachante? Há meses sempre uma outra pessoa é quem fazia a entrega? O que ouve?
O novo entregador de pizzas, num tom melancólico e triste, disse:
- Ele morreu.
Senti, de repente, um vazio feito de palavras silenciosas. Senti que sempre algo habita por trás das palavras ditas. Algo dito num não-dito. Algo que ameaça a ordem das coisas da vida.
Nunca mais ouvi aquela frase tão bem dita: “As palavras são feitas de perdas!”
As palavras são feitas de sentido que se perdem! Elas nunca se mostram por completo. Sempre estão a esconder algo que não se diz por mais que queiram se dizer, por mais que o sujeito, dono delas, as digam plenamente.
Um deslize sempre habita o seu interior. Uma falta de… que dá às nossas vidas uma estrada percorrida incompletamente ou a ser percorrida sob a égide de um eterno fio condutor imaginário que nuca se completa.
Agora, deixei de pedir pizzas. Deixei de ficar na varanda de meu apartamento. Não há mais nada o que fazer por lá…

 





Conto publicado no livro "Por trás dos panos" - Contos selecionados
Edição Especial - Janeiro de 2021

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