Helio Sena
Massapê / CE

 

 

Morte

 

Seu celular toca. Número desconhecido.
– Alô...
– Alô, é da funerária?
- Hem?!
– Funéraria? É, sim... Claro!
– Meu nome é Sara. Sara da Silva Nunes. Sou sócia daí.
– Pois não, senhora. O que deseja?
– Preciso de um caixão.
– Ok. É pra senhora mesmo?
– Como disse?
– Digo: quem faleceu?
– Minha sogra.
– Como ela se chama?
– Etelvina dos Anjos.
– Um instante, dona Etelvina.
– É Sara, moço.
– Oh, perdão, dona Sara. Minutinho. Vou verificar seu cadastro.
Um minuto, um minuto e meio.
– Dona Sara?
– Sim?
– Lamento, mas o seu nome não consta em nossos arquivos...
– O quê?! Como não? Sou sócia daí faz três anos!
– Lamento, senhora.
– Quero falar com o gerente, já!
– Sou eu mesmo, dona Etelvina...
– É Sara! Sara, entendeu? Você é surdo, ou é burro mesmo?
– A senhora está me ofendendo, dona Sara.
– Vamos, verifique aí de novo, vai. Meu nome tem que estar aí.
Mais um minuto.
– Infelizmente, dona Sara...
– Não pode ser, eu vou aí agora mesmo.
– Espere! A senhora tem certeza que não ligou pra funerária errada?
– Aí não é a São Francisco?
– Não, senhora, somos a Descanso Eterno.
– Ai, moço... Como isso pôde acontecer?! Me perdoe, por favor!
– Que nada, isso acontece, dona Edelvina.
– Quê?! Ora, vá pro inferno!
Furiosa, a mulher desliga.
O rapaz cai na gargalhada; depois fica sério, muito sério.
Não é bom brincar com a morte...

 

 

 

 
Poema publicado no livro "Muito moinho pra pouco Quixote" - Contos - fevereiro de 2018