Henrique Bonamigo
Três de Maio / RS

Sobressaltos

 

 

Davi sentia-se exaurido e só, vivendo um pesadelo. A doença de Mariana havia feito do seu viver uma rotina de sobressaltos e incertezas. Mantinha-se em pé, e disto tinha certeza, pelo amor que sentia por Mariana, e era por ela que naquele dia mais uma vez iria ao hospital para beijar-lhe a face e desejar ardentemente que ao vê-la, os amados olhos azuis de Mariana, estivessem finalmente abertos. No dia anterior, havia voltado para casa perturbado após a conversa que tivera com o médico, que comedido e reticente disse que o quadro clinico de Mariana era complexo e que não poderia adiantar nada a respeito de sua recuperação.

Próximo ao hospital, Davi voltou a sentir a sensação de pavor que ultimamente o deixava desesperado. Desde que Mariana adoecera estava sendo acometido com frequência por episódios de taquicardia paroxística que acentuava ainda mais o massacre físico e mental a que vinha sendo submetido. Nestas ocasiões, sentia o abraço da morte cingir seu corpo. Mas, como de outras vezes, conseguiu superar a crise e em pensamento prometeu a Mariana que nenhum obstáculo iria impedi-lo de chegar até ela, de dizer que em breve tudo ia ser diferente, que voltariam a sorrir juntos e retomar a vida a partir de um novo cenário.

Diante do longo corredor no qual se encontrava o quarto de Mariana, Davi voltou a ser impactado por uma nova angústia; viu uma jovem que pareceu-lhe ser a irmã de Mariana, sair em prantos do quarto onde Mariana estava internada. Sentiu o chão sumir debaixo dos seus pés. “ Não pode ser!”, pensou. “Não pode ser!”, repetiu para si mesmo. O temor aumentou ainda mais quando viu uma maca com um corpo coberto ser empurrada para fora do quarto. “Meu Deus!...” Sentiu o corpo gelar, desesperou-se, queria gritar...

Quando a jovem em prantos e a enfermeira passaram pelo seu lado, percebeu que não era a irmã de Mariana, e então, num gesto súbito e surpreendente, Davi descobriu o rosto que estava na maca, não era Mariana. Foi repreendido pela enfermeira enquanto parecia enlouquecer de alegria.

Sentou-se em uma pequena sala para recobrar-se, não cabia em si. Uma estranha euforia parecia sufocá-lo. Meditou sobre o acontecido e concluiu que havia se enganado por causa da distância; o quarto da pessoa que havia falecido era ao lado do quarto de Mariana.

Foi até a janela da sala e respirou fundo, teve a sensação de que havia nascido outra vez. “Mariana está viva... irei vê-la... hoje ela haverá de abrir os olhos, olhar para mim.”

Caminhava em direção ao quarto quando o Dr. Moacir veio ao seu encontro e pousou a mão no seu ombro.
- Lamento informar, sua esposa acaba de falecer.

 

 
 
Poema publicado na "Seleta de Contos de Autores Premiados"- Edição Especial - Janeiro de 2017