Anchieta Alves de Santana
Uruçuí / PI

 

O nome vale nota

 

           Era 1996. Naquela ano, por telefone, Rosa Saraiva ficou sabendo que a filha, Marliciane, oito anos de idade, aluna do 3º ano do Ensino Fundamental, não tinha conseguido nota suficiente para sua aprovação. Ficou, demasiadamente, inquieta. Não acreditava. Acendeu um cigarro, deu alguns passos em direção à cozinha, mexeu em alguns objetos sobre a mesa, debruçou-se numa janela lateral e chorou...Não queria acreditar naquela notícia. Quem sabe, poderia ser engano da diretora da escola. Enganos acontecem. Achou melhor esperar que a filha voltasse da escola. Uma espera longa e angustiante.
        Era manhã de quarta-feira, véspera de férias na Escola Municipal Nova Brasília. Na sala de aula surrada pelo uso diário, enquanto alguns alunos gritavam, gesticulavam, cantavam e exibiam suas notas aprovativas, Marliciane, metida numa ansiedade desmedida, aguardava o momento    de receber suas avaliações. De súbito, entra sua professora de Língua Portuguesa. Passos longos, vestido decotado, seios à mostra e um sorriso de canto de boca. Aproxima-se da mesa, põe sobre ela o pacote de avaliações e, olhando na face de cada aluno, deixa transparecer um certo ar de satisfação e ironia em seus gestos.
       Por alguns instantes a sala foi invadida pelo silêncio. Um silêncio frio, indesejado. Via-se a ansiedade corada na face de cada discente; e, na incerteza de notas aprovativas, um nervosismo batia forte nos componentes da sala. Percebia-se, só em olhar cada rosto com ar ainda pueril, que o ritmo cardíaco parecia estar fora dos trilhos.
        A professora sentou à mesa e começou a tecer comentários sobre o ano letivo que ali se encerrava, do comportamento da turma, disse que alguns alunos passaram o ano brincando, muitos deixavam de fazer suas atividades pedagógicas, teceu comentários sobre as punições que se fizeram necessárias, da saudade, das amizades, enfim, fez aquele discurso um tanto previsto para situações como aquela. A mestra terminou seu discurso deixando brotar lágrima dos seus graúdos e negros olhos. Enquanto a professora proferia sua mensagem, Marliciane, que precisa de nota máxima para ser aprovada em Língua Portuguesa, ficou pálida de medo. Lembrou-se que tinha esquecido de escrever seu nome na última avaliação. Não tinha dúvidas, ia ser punida.  A professora de Língua Portuguesa não perdoava.
     Depois de folhear as avaliações por mais de uma vez, a professora começou a entregá-las. Os alunos eram chamados pelo nome. Uns riam, vibravam, enquanto a pequena Marliciane encolhida em nua cadeira, murmurando, olhos fitados na folha de papel que acabara de receber, e que trazia, em letras garrafais vermelhas, a seguinte mensagem: “Marliciane, foi descontado um ponto de sua nota porque você esqueceu de escrever seu nome na avaliação. Não esqueça mais, tá?”
     Diante da sentença, enquanto ecoava a gritaria, as gargalhadas, rolavam lágrimas no rosto indefeso da garota. Aquela face corada, acostumada aos risos contagiantes, às vitórias na vida escolar, agora experimentava o outro lado.

 

 

 
 
Poema publicado na "Seleta de Contos de Autores Premiados"- Edição Especial - Janeiro de 2017