Lucio Carlos Honorato Filho
Macaé / RJ

 

 

Triângulo escaleno amoroso

 



          Fazia tempo que Genival mantinha duas mulheres dentro de casa: Ana, sua esposa de papel passado, e Cida, que segundo as más-línguas do bairro, seria sua amante. Digo assim porque ninguém tinha certeza de nada, a não ser que os três conviviam amistosamente e, pelo que demonstravam, viviam felizes; estavam sempre felizes.
          Genival tinha um pequeno comércio de secos e molhados na Praça da Matriz, bem ao lado do boteco do Totonho, este um típico sabe-tudo muito comum nas cidades do interior. E não raro, do balcão de sua loja, Genival podia ouvir os comentários maledicentes dos pinguços, lá no bar, falando de um certo "triângulo amoroso" nas adjacências, referindo-se, é claro, à sua condição conjugal.
          Certo – e isso ninguém discutia - era que tanto Ana quando Cida eram duas mulheraças. O mínimo que podia dizer sobre seus atributos é que eram gostosíssimas. Uma loura, outra morena. Uma mais pra alta, outra mais baixinha. Uma de olhos verdes, outra de olhos negros amendoados. Uma de seios volumosos e bem empinados, outra de glúteos de uma formosura tal capaz de deixar qualquer marmanjo babando.
          Só que aquele papo de "triângulo amoroso" já estava incomodando; de vez em quando Genival saía do balcão, chegava à porta do estabelecimento e olhava com certo ar desprezo para aqueles invejosos, se bem que no fundo ele até que se sentia um tanto envaidecido pela fama de garanhão.           Mas nem sempre seus olhos demonstravam tal envaidecimento, havia uma certa tristeza neles. E Totonho, como bom psicólogo artesanal, já havia desconfiado que as coisas não deviam ser bem assim como os fofoqueiros comentavam.
          - Amigo Genival, tenho notado que o amigo anda meio borocoxô... Será algum problema que este seu amigo aqui possa ajudar?
          Genival pensou, pensou e resolveu se abrir:
          - Totonho... é essa história de triângulo amoroso que andam falando por aí. Coisa chata isso!... Eu não me meto na vida de ninguém, agora vêm esses biriteiros com a conversinha de quem tem um triângulo amoroso aqui no bairro... E eu sei que é de mim que eles estão falando.
          Totonho, então, para amenizar a dor do coitado, fez questão de mostrar seus conhecimentos de matemática.
          - O amigo não deve se preocupar com isso, além do mais, o triângulo até que é uma bela forma geométrica, com tantas possibilidades estéticas...
          -... Você entende de matemática, não é mesmo, Totonho?
          - Modéstia à parte!
          - Pois então, meu amigo, fique sabendo e guarde este segredo com você: eu vivo um triângulo amoroso, sim! Mas, não se trata de um simples triângulo isósceles. O triângulo é escaleno, entendeu? Escaleno!!!

 


 




Conto publicado no livro "Sonhos parados no tempo " - Contos selecionados
Edição Especial - Novembro de 2020

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