Henrique Gondim
Natal / RN

 

 

 

Os anjos da minha vida

- Eles, elas e eu -

            Eu sabia que ela queria ser a primeira a me parabenizar. Sua voz emocionada às sete da manhã me vez relembrar outros momentos de minha vida...
Eu estava inquieto no seu ventre naquele 9 de março de 1965. Desde cedo procurava as portas de um novo mundo. Ela com sua ferida recente pela morte de meu pai, sentia algo diferente; sentia desconforto, sentia ansiedade, sentia dores de amor. Era a dor da esperança de um filho que chegava e uma dor sangrante de saudades de um amor que havia sido levado. A noite foi escolhida para me recepcionar, já que seria dentro dela a quem eu iria confiar os meus mais profundos segredos. Sentimentos distintos fizeram parte daquele triângulo de vida; ele no céu chorava de tristeza, queria estar comigo nos braços; ela chorava de saudades, precisava dele ao seu lado; eu chorava de fome, simplesmente de fome...
Nasci com epilepsia e quando a febre chegava era inevitável convulsionar. Aquela que me segurava em seus braços esperando uma volta impossível, sofria desesperada sem saber o que fazer. Instintivamente me tomava no colo, rezava junto com ele e mais um dia se ia...
O relógio da vida girava rápido e na dança dos ponteiros ela terminou por não resistir a um novo amor. Ele não podia mais nos proteger na terra e mesmo com ciúmes, lá do céu, liberou. Eu ganhei um outro pai e fiquei com três. Dois no céu e um na terra. No entanto, mãe, simplesmente ela...
No passar dos outros marços, fiz amigos, verdadeiros amigos...
Ganhei novos irmãos por quem me apaixonei. Paixão tão grande que o irmãozinho que me acordou com seu choro por muitas noites, tornou-se o meu anjo da madrugada.
Conquistas foram se sucedendo e tudo o que quis me foi dado. E confesso, não sofri nada para consegui-las. A maior das outras conquistas foi uma outra mulher. Elas juntaram-se e formaram uma dupla única que nunca mais me fez sentir-me só.
Eu só não tinha idéia de que coisas melhores poderiam vir... Elas vieram, ele também... Minhas filhas são um conforto para minha alma e o meu filho se senta ao meu lado para assistir futebol. Torce desesperado como eu.
Quando olho no céu sempre o vejo brilhante e me mandando recados de felicidade. Ele está num lugar muito bonito...
Quando penso em sofrer ela se apresenta para fazer isto em meu lugar. É teimosa e não adianta interferir. No máximo dividir o sofrimento...
Quando penso em alguém, só penso em vocês, ai então estamos bem...
Isto já dizia um outro poeta...         

 


 




Conto publicado no livro "Sonhos parados no tempo " - Contos selecionados
Edição Especial - Novembro de 2020

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