Helio Sena
Massapê / CE

 

 

 

Triângulo

           

         

– Aí, chega mais. Você tá bem?
– Se eu tô bem? Tô, ora bolas!
– Certeza?
– Claro!
– Pois não parece.
– Por quê?
– Sua cara te entrega.
– Quê que tem minha cara?
– Parece um pandeiro. Redonda de tristeza.
– Redonda?
– É só um modo de falar.
– Ah, sei.
– Não quer me contar?
– ...
– Diz aí, vai!
– Promete que não vai dar uma de bateria?
– Quê?! Bateria?
– Fazer barulho, alarde...
– Olhe, saiba o senhor que sou discreta como uma flauta, viu?
– Tá bem, vou te contar...
– Desembucha. Sou toda ouvidos. Quem nem uma tuba.
– Uma tuba?
– Sim. Ouvido enorme, total.
– Aquilo não é uma boca?
– Faz de conta que é ouvido. Desembucha.
– Tô gostando de alguém...
– Eu sabia, eu sabia!
– Sabia?!
– Lógico! Pensa que não te vejo reparando nela?
– Vê?
– Toda hora...
– E o que você acha? Tenho chance?
– Nenhuma!
– Nenhuma?
– Quer dizer... Ainda não percebeu que ela só tem olhos pro outro lá?
– É, acho que você já tinha falado isso antes...
– Pois então?
– E agora, o que eu faço? Desisto dela?
– É o mais sensato a fazer.
– Acha mesmo, Gaita?
– Vai por mim, Triângulo. Olha lá como estou certa!
Do outro lado do estúdio, a Guitarra conversava com o Saxofone...
Despreocupada e inocentemente.

       

 


 




Conto publicado no livro "Sonhos parados no tempo " - Contos selecionados
Edição Especial - Novembro de 2020

Visitei a Antologia on line da CBJE e estou recomendando a você.
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