Alberto Magno Ribeiro Montes
Belo Horizonte / MG
O homem que falava por haicais
Josenildo sempre foi fascinado pela literatura. Lia praticamente de tudo, principalmente poemas. E com a Internet então, era fácil pesquisar sobre os diferentes modos de fazer poesia. Um dia, leu um artigo que ensinava a escrever HAICAI e gostou tanto, que imediatamente tentou escrever um. Não é que ele conseguiu? Foi treinando e ficou tão viciado, que passou a FALAR POR HAICAIS. Explico: algumas pessoas não falam por sinais, através da língua brasileira de sinais (LIBRAS)? Então! Após certo treino, ele só falava por HAICAIS, isso é, tudo o que dizia (e também o que pensava), era em 5-7-5 sílabas. E geralmente seguia a estrutura do verso e da sílaba, do haicai tradicional, passando às vezes a fazer alguns mais modernos, saindo um pouco dos princípios rígidos dessa forma de poesia.
Um dia, encontrou um velho conhecido, seu conterrâneo e relembrando tempos passados, desde quando eram crianças, rememorando até mesmo seu nascimento, foi logo dizendo:
E quando eu nasci
nem anjos ou arcanjos
vieram saudar.
E complementando, falava que nascera na mais bela estação do ano:
Os campos floridos
e miosótis nas janelas:
linda primavera.
Em sua juventude, na época do namoro apaixonado, quando os sonhos se preparavam para tomar forma e tudo era visto de maneira tão poética, impossível não se extasiar diante da beleza das coisas. Assim sendo, ficava até difícil deixar de fazê-los (os haicais). E sonhando, pensava:
No meu casamento
serei muito feliz
com minha mulher.
Certo dia bem quente de verão, logo ao amanhecer, quando a quentura do momento incomodava logo ao despertar, falava nesse momento:
De manhã assim
o dia já segue quente
com o sol bem alto.
Numa tarde sábado, de folga no serviço, descansando na rede:
Nada a fazer…
vejo as nuvens passarem
nesta tarde linda.
Ao ler no jornal notícias sobre a longa estiagem no sertão nordestino, já ia logo comentando, assim falando às pessoas:
Chuva chega tarde
e o sertão sofredor
a morrer de dor.
Antes de dormir, numa linda noite de luar, era propício dizer:
Lua altaneira
clareia a imensidão
dessa noite calma.
Costumava dizer que quando morresse, não queria velório, nem nada:
Quando eu partir
não quero choro por mim
somente adeus.
Mas enquanto esse fatídico dia não chegava, Josenildo continuava com sua estranha e original mania.
Assim ele segue
vivendo muito feliz
formando os haicais.
Ops, mais um haicai!
Essa moda pega!!!
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