Claudia Fontenele Alves da Silva
Águas Claras / DF

 

 

A violência está presente em nós

                

 


     

Quisera poder dizer que no mundo em que vivo tudo é lindo, tudo é maravilhoso; que o céu é de um azul belíssimo, que os pássaros cantam e, que as flores exalam perfumes inebriantes. Tudo isso é real, mas há um mal crescente em mim; há um mal crescendo em cada coração, quer de um adulto, quer de uma criança.
Quantos de nós já não fomos alvo da violência presente na sociedade? Quantos não perdemos um ente querido ou um conhecido, vitimados por uma bala perdida ou pela brutalidade descomedida de alguém, que também pode ter sido vítima da violência presente em cada um de nós?
Quero falar da violência presente em nós. Da violência mascarada de indiferença. Da violência que paga ao mal com o mal. Da violência travestida de justiça por parte de homens que olharam por muito para o mal e, que acabaram se tornando monstros ao aplicar as leis para coibir o mal. Enfim, quero falar do buraco negro que tem atraído muitos de nós para o abismo profundo da civilidade e do dito progresso.
Ao ler manchetes em jornais ou ver os noticiários na televisão, deparo-me com um imenso desejo de abandonar este mundo terreno. Fico totalmente desesperançada da bondade e da “imagem de Deus” em cada ser humano. São tantas notícias ruins.
Seres humanos praticando coisas horríveis contra outros seres similares. Homens matando suas mulheres. Pais matando filhos. Filhos matando os pais.
Feminicídio, infanticídio, parricídio e tantos outros crimes. Crimes contra a natureza: fauna e flora. Crimes por mesquinhez. Crimes hediondos. Crimes que demonstram a nossa incapacidade de sentir o outro ser como imagem e semelhança de Deus. E, pasmem os “bons samaritanos”, crimes que podem ser cometidos por qualquer um de nós. Crimes praticados no afã da loucura e insanidade mentais ou crimes praticados com frieza e indiferença.
Quanto à indiferença?! É a respeito dela que quero falar.
Não pensamos que ser indiferente ao outro pode ser considerado como um ato de violência. Mas, sinceramente, tenho cá as minhas convicções. Creio, piamente, que quando ignoro a dor, a percepção de mundo, os interesses e o outro, propriamente dito, eu sou capaz de estar cometendo um ato de violência para com o meu semelhante. Deixe-me explicar melhor.
Certo dia, eu vi uma pessoa estendida na calçada. Ela estava bêbada ou drogada. Não sei. Só sei que passei por ela sem me importar. Não me importei com sua situação. Não me preocupei em saber o porquê dela estar ali, naquela situação de miséria, de desamparo social e econômico. Fui indiferente.
Em outra ocasião, eu mesma fui tratada com total desprezo e indiferença. E, isso dói quando acontece conosco.
Por que, então, ficamos indiferentes ao outro? Por que não fazemos caso quando um “marginalizado” morre de fome e frio nas ruas, mas fazemos campanhas para arrecadar fundos para a reconstrução de catedrais? Não tenho nada contra conservar os patrimônios históricos. O que me parece é a incoerência dos nossos discursos com a nossa prática de vida.
Não sou “uma Madre Teresa”! Sou uma pessoa que, a cada dia, tenho olhado para o abismo entre meu discurso e a minha prática de vida. Às vezes, eu sou uma pessoa muito empática com as mazelas dos outros; outros dias, eu sou um poço de frieza. O que quero dizer, de fato, é o quanto somos passíveis de executar o mal. Somos capazes de belos gestos de altruísmo, bem como somos capazes de exercer sobre o outro um egoísmo extremo.
Perdoem-me a franqueza. Estou convencida que a violência está dentro de nós. O que nos impede (bons samaritanos) de praticar o mal é o senso de moral implantado em nós. Esse senso de moral é uma luz que tem brilhado em nós e, que está totalmente ausente nos que se encontram em trevas interiores.
Que a luz de Cristo possa resplandecer em nós. E, que ao sermos inundados pela luz, não sejamos indiferentes às trevas alheias.
Nada nem ninguém pode nos impedir de fazer a diferença num mundo onde o amor em ação está praticamente em desuso. Amor não é sentimento. É escolha. A indiferença também não é sentimento. É escolha.
Escolha o comprometimento. Escolha o amar, o doar-se ao outro. Escolha a não violência. Seja um agente da paz. E, lembrem-se: “Das trevas resplandecerá a luz” (2 Co 4:5).

 

 
 
Publicado no Livro "Vox populi, vox Dei" - Edição 2019 - Agosto de 2019