Maria José Zanini Tauil
Rio de Janeiro / RJ

 

 

Não te deprimas...




         

Te amo mais que tudo. Não é amor unilateral. Sei que é mútuo, mas de diferentes profundidades. Veto-te em mim, no modo de ser, nos momentos de introspecção ou de sociabilidade. Às vezes queremos romper barreiras, estar mais perto. Se o corpo não vai, a alma segue e cumpre seu objetivo. Ainda que os muros invisíveis sejam maciços e opacos, meu desejo é mais tenaz através do pensamento.
Há eternidade no meu amor e todos os infortúnios, mesmo os escombros e desconstruição, mesmo que inomináveis, resistentes e opacos, são sem segredos, pois meu amor é capaz de  captar tua alma, teus signos e teus enigmas. Penetro nela. Percebo  que não é indiferente nem vazia, nem estranha, nem hostil.
Em teu coração existe um jardim harmonioso. Em pensamento te abraço como um polvo, mas sem  esmagar-te com meus tentáculos. Creio que já entendeste que os desertos de nós, ainda que espessos de brumas, mostram frestas de sol, impondo sutilmente o renascimento do que está adormecido em ti.
És o meu avatar que não morreu na praia, há incandescentes  razões para esse renascimento para a vida em plenitude, com teu sorriso franco, com o brilho do teu olhar quando estás feliz. Volta ao que foi interrompido, pois uma vida linda te abre as portas. Deus nos mostra sempre saídas, que mesmo singulares, no futuro se mostrarão valiosas.
Em teus momentos de luz queimada, vi raios de esperança. És flor adormecida em harmonioso jardim. Em ti existe o tudo e o nada ao mesmo tempo, porém, surda aos sermões dos púlpitos, que falam de um amor incondicional de um Pai que nos carrega nos braços quando estamos fragilizados. O pranto, quando rola silencioso de tua alma, eu gostaria de chorá-lo por ti, prantear tuas dores e fazê-las minhas. Existe um sino numa capela erguida nas nuvens espreitando-te, pronto para celebrar com muitas  badaladas  teus êxitos.>
Desde que submergistes à  dor, as flores  deixaram de se abrir e sucumbem às emboscadas da noite. Contigo as árvores sangram, mas não gritam quando laceradas pelos facões da vida. És a mais doce de todas as criaturas, uma enciclopédia de floresta fechada, porém prenhe de amor, mesmo na solidão. Não és uma fábula ou ensaio fragmentado de uma triste história de amor, imerso em inverno sibérico; tens a morna face da noite, em sonho sonoro de uma sinfonia nostálgica e bela.
Tira o espinho que sangra teu coração, pois o amor é o sentimento mais blindado que uma pedreira. Estás acima do amor, porém deixa que ele te eleve aos píncaros que mereces. Não te recuses a amanhecer, abriga-te das noites tempestuosas porque o sol retorna sempre ao nosso horizonte. Lembra do  primeiro que te amou,  não te apartes dos abraços amorosos de Jesus, pois eles estão saudosos de ti.
Diante dos dias negros  que te ocuparam internamente, de nada valeram as barricadas do espírito, os fuzis e os canhões, a artilharia tão potente que  te deixaram tão frágil.
Afugenta dessas matas interiores essa pantera, com a força que tens e desconheces. Desenterra a tua fé. O mal está solto como o vento e ares navegantes e salgados se acercaram de ti e se infiltraram em tuas carnes,  teus dedos e teus medos.
Tome tua juventude como escudo e lute contra o exército das sombras, sabotando a infra-estrutura de ti mesma. Não sejas o alvo preferido de teus próprios ataques.Ensurdeça  teus pensamentos, pois são força motriz que embaraça ideias, desertos e maremotos.
Se o amor não fosse indomável, não atravessaria trevas nem se alojaria em sentimentos que julgávamos extintos. Veja a estrela que teima em transluzir sobre as ruínas do cérebro e da razão.
Não teimes em não subir os degraus que te tirarão de dentro de ti. Lembra que a colméia sente falta de sua abelha rainha e os castelos dos contos de fada anseiam pela volta de sua mais bela princesa.
Vamos! Escandalize a noite surgindo esplêndida com tua varinha mágica, com o teu mais  belo sorriso. A aurora te espera depois de tantas madrugadas trovejantes.
Ouça o marulho das folhas na tua janela. Não feneças ao sabor do tempo, pois o ocaso, o perfume das manhãs se curvam para te dar boas-vindas.
Sê feliz, pois a vida é breve e eu te amarei até o último suspiro.


 




Conto publicado no livro "Aquele abraço" - Contos selecionados
Edição Especial - Outubro de 2020

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