Neri França Fornari Bocchese
Pato Branco / PR

 

 

A Vida se realiza

 


   

Há muito tempo, uma menina sonhava em ser feliz. Tinha, apesar da pouca idade, em seus planos, estudar e muito. Também seguir uma carreira. Como quase todas as mulheres queria casar, ter filhos. Teve 4 meninos. O caçulinha foi um presente Divino.
Sonhava com um marido amoroso, prestativo e sempre presente. Planejava ter 3 filhos:dois meninos e uma menina.
Estudiosa, sempre foi. Participava na sala de aula com as lições em dia. Nas aulas de geografia, história e ciências biológicas, já estava sabendo sobre os temas abordados. Estudava por antecipação, a sua participação era mostrar que tinha conhecimento do assunto. Não fazia por maldade, mas sim por gostar de ter domínio do assunto. 
Gostava muito de criar textos, desde que começou a dominar a grandiosa arte da escrita. Por ter sido alfabetizada de maneira errada, trocava muitas letras e tinha uma ortografia bastante irregular.
Obrigada a fazer caligrafia, as letras não tinham o mesmo tamanho. Pois escrevia miudinho. Ao invés de ser ajudada, era criticada e suas escritas lidas da maneira como as escrevia, trocando as letras. 
Isso fez com que ficasse adormecida dentro dela a vontade de criar muitos contos; dar asas à imaginação e produzir escritos que na mente de sua mãe e de alguns professores eram bobagens e não criatividade. 
Assim foi enfrentado os desafios que uma vida cheia de restrições, de não pode isso, não pode aquilo e ainda com muitas dificuldades econômicas.
Quando cursou a Escola Normal, entendeu o seu problema de alfabetização. Da falta de preparo de muitos professores. 
Passou a escrever com o dicionário do lado, para não errar nenhuma palavra. O desejo da escrita era muito grande dentro do seu âmago. Hoje se trona fácil, pois o computador mesmo corrige.
Não era namoradeira, as condições de vida não permitiam. E, já trabalhava muito. O primeiro namorado foi um sonho.
Não durou muito. Era de partido político contrário o da família. E a senhora sua mãe, com uma amiga, trataram de acabar com o namoro. Foram à casa da madrinha do namorado e fizeram propaganda contrária aos dotes da pretendida. Não saber cozinhar para uma família descendente de italianos a quase 60 anos atrás não tinha perdão. 
Foi o que bastou para que o encanto de transformasse em lágrimas. 
Mas a vida continua. A desilusão foi muito grande. O tempo passou. E, é o melhor remédio. Resolveu que não amaria mais ninguém. Promessa até que aparecesse outro pretendente. Esse sim, do mesmo partido político dos pais, logo aceito, moço bonito e trabalhador. Trazendo promessas de uma vida amorosa e feliz.
Não foi fácil, para ela, porém venceu as resistências. Mulher não pode ficar solteira, precisa casar-se ou então ir para um convento. 
A vida não foi das melhores. Faltou o encanto. Foi preciso trabalhar e muito, sem ter tempo para participar de muitos projetos próprios da idade e da vida de recém-casados. 
 E, as promessas amorosas logo se esfumaçaram pelos ares. O importante era estar casada e assim prosseguir na existência. 
Porém estudou e muito, foi vencendo profissionalmente. Lecionou desde as salas multisseriadas até encerrar a carreia, depois de 48 anos e 6 meses, na Universidade Tecnológica, a primeira do Brasil, no curso das Engenharias. 
Os filhos chegaram, foram todos meninos. Um partiu muito cedo, mais um desalento a ser enfrentado. O destino assim quis. Ficou a saudade.
Os filhos cresceram, estudaram, todos hoje Engenheiros bem-sucedidos. Todos casados, as noras mimosas, esposas escolhidas, os netos são a recompensa do bem- viver.
Hoje, escreve sem medo de errar e de dizer o que pensa. 
A Vida, segue o seu destino. 


 




Conto publicado no livro "Contos Selecionados"
Edição Especial - Julho de 2021

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