Romilton Batista de Oliveira
Itabuna / BA

 

 

Ao gari, uma crônica feita de gratidão



        

Esta crônica que aqui trago ao consciente leitor é o meu olhar diante de uma profissão tão dura, tão indiscriminada, tão esquecida, tão silenciada, tão mal paga pelos poderes públicos, tão pouco vista por nossos crédulos ou incrédulos olhares. É uma crônica denunciativa, poeticamente construída sob os pilares de um som que sempre ouço do interior de minha casa.
Esse som marca que eles estão a passar pelas ruas, seja em tempo de sol quente, seja em tempo chuvoso, não importa a estação, eles estão sempre prontos, alegres, dispostos, a espantar os urubus, e a levar seus “alimentos” para dentro do carro de lixo que passa às pressas pelas ruas… e eles, os campeões andarilhos, os campeões da grande e longa caminhada, pegam sacolas de lixos, onde os cidadãos misturam nesses horrendos sacos com quebrados vidros, máscaras contaminadas, apodrecidos alimentos, restos de cortes de frango e carne apodrecida, plásticos, tudo junto, junto e misturado.
E eles, a caminhar por milhares de quilômetros, pulam, abaixam os corpos, perambulam como bons atletas das olimpíadas da discriminação!
E eu, de minha janela, observo-os atentamente, e penso: “eu poderia ser um deles!” Que trabalho cansativo e tão valorativo e significativo, porque são eles que limpam as ruas, vielas, bairros, cidades, países, todos os dias. Incansavelmente, todos os dias!
João, Pedro, Antônio, José, Claudionor, Ambrózio, Cristiano, Maria, Júlia e Judite, entre tantos outros heróis anônimos, limpadores de nosso vasto mundo! Sei que vejo mais homens do que mulheres a trabalhar como gari, heróis desta minha rápida crônica feita de palavras que me fazem sentir mal, porque eu sei o quanto eles recebem mensalmente pelo árduo e precioso trabalho que prestam à sociedade!
A todos vocês, escrevo esta crônica feita de gratidão e confraternização. Sei que deve haver um sindicato que defendam os seus direitos, mas sei que muito ainda falta para que eles possam ser dignamente respeitados, a começar por esta comemoração que aqui em faço por meio deste sofrido texto. Chamo de sofrido porque sei da realidade de cada um: são homens e mulheres, casados em sua maioria, que chegam em seus lares e ainda procuram um tempo para estudar e educar os seus filhos!
E o governo diz “Pátria amada, Brasil!” Que pátria amada que deixa os seus filhos a morrer de fome, a trabalhar sem as devidas condições de higiene, expostos, todos os dias, a doenças, vírus, bactérias, enfim, à morte!
Este texto que poderia ser alongado, mas devido a dor que o escritor que ora escreve não consegue dar continuidade porque é preciso ter força para dizer a toda essa gente que olhem para esse trabalhador que, incansavelmente, carrega os lixos, o fedido lixo dos mortais inconsequentes que poderiam separar os vidros dos plásticos e outros tipos de lixos que possam levar à contaminação ao pobre trabalhador, que paga impostos e que é gente como nós!
Creio que há um dia especificamente no calendário em que se comemora o dia do gari, mas eu tenho certeza, que prefeitos, governadores e políticos em geral, nada fazem por esta categoria tão sofrida. E este poeta, contador de palavras, que dá a eles um caminho certo, um lugar a ser destinado, cobra das autoridades que algo venha a ser feito em prol desta tão sofrida categoria.
São capoeiristas, cantadores, pintores, malabaristas, atletas, anônimos poetas, sonhadores que desejam, um dia, serem reconhecidos com o direito que eles têm. E não haverá um dia para celebrar esse tipo de trabalhador que é o limpador da imunda terra suja e corrupta. A esses trabalhadores, todos os dias são especiais.
Não vou aqui evocar um santo protetor dos garis, vou aqui evocar a ação das autoridades, dos poderes públicos, do ministério público, dos vereadores, dos deputados estaduais, dos poetas, dos escritores, dos advogados, dos pais de famílias, da juventude, de todos cidadãos deste país que também possuem outros sofrimentos, outras categorias profissionais abandonadas pelos poderes públicos a receber migalhas em forma de um salário-mínimo injusto e opressor!
Ao gari, seja homem ou mulher, receba o singelo agradecimento do poeta e escritor. Receba o meu apreço, o meu carinho e a minha gratidão! Sem vocês o mundo viraria um grande lixo podre, cheio de urubus, de carniças e homens podres e insanos, embora saibamos que, independente da podridão que o mundo se tornaria, os insanos sempre existiram e sempre existirão! Canalhas! Corruptos! Oportunistas! Avarentos! Individualistas! Cretinos! Imundos! Inimigos da poesia da Libertação!

 

(Romilton Batista de Oliveira, Itabuna, Ba, 19/07/ 2021, às 00:14)

 

 


 




Conto publicado no "Livro de Ouro Contos "- Edição 2021 - Outubro de 2021

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