Rozelene Furtado de Lima
Teresópolis / RJ

 

 

A felicidade no bolsinho

 

          Paulo Georges achava que o mundo era pequeno, acabava logo ali, bem pertinho! Cabia no bolsinho da sua surrada calça. Iria achar a ponta do mundo e dobrar como se dobra uma folha de papel. Quero ser dono do mundo, vou dominá-lo, vou mudá-lo, vou transformá-lo com minhas mãos. Vai ficar do meu jeito, vou fazer dele o que eu quiser: um barquinho para eu navegar nos mares mais distantes; uma espada para lutar com os gigantes e animais ferozes; uma fonte de água limpa para matar a sede; uma casa com uma mesa grande cheia de comida e uma cozinheira caprichosa; uma cama bem macia para eu descansar e mesmo ter um porquinho para ser meu relógio de despertar. E tudo mais que desejar. Vou fazer isto assim que eu encontrar a ponta do mundo.  E saiu com um embornal do lado levando nada.
          Caminhou dias e noites. Parava para descansar e comia o que encontrava ou que as pessoas bondosas lhe davam.
         Certo dia deitou-se à beira de um riacho, à sombra de uma frondosa árvore e dormiu, vencido pela certeza que estava chegando à ponta do mundo. Precisava, então, de forças para começar a fazer primeira dobra. E sonhou que um pássaro grande aproximou-se dele e perguntou: - Quando você dobrar o mundo como um bilhetinho, vai ter que dobrar junto todas as pessoas vivas e mortas e será que seu bolsinho dá para carregar todos eles? - Claro que não! Respondeu Paulo Georges. Nisso, acordou com um bater de asas e ainda viu um pássaro grande voando para longe.  - Pássaro atrevido, aposto que quer o mundo para ele. Pensando assim coçou a cabeça, esfregou o rosto, enfiou o dedo no ouvido direito, puxou a orelha esquerda, deu um tapa na coxa, bateu com os sapatos no chão, deu um pulinho para trás e lambeu a palma da mão. Fez tudo isso como se fosse um ritual para parametrizar seu plano. No entender dele faria o mundo ficar bom, mas se já era bom, seria muito melhor de viver aqui. No bolso dele só entraria coisa boa e gente feliz.
        Continuou a caminhada. Lembrando-se do sonho e que seria impossível dobrar as pessoas, porque elas são resistentes, teimosas e não iam querer ficar no bolso dele. E, se caso ele conseguisse convencê-las, elas seriam capazes, ladras que são, de lhe roubarem o mundo. Precisava se preparar mais e bolar um plano melhor. 
        Estava tão convicto, tão certo de seus planos e de repente, apareceu aquele pássaro que plantou uma grande dúvida naquele juízo fértil, dividiu a certeza e multiplicou a insegurança.
        Voltou àquele riacho para sonhar e devolver ao pássaro aquela questão que ele botou na sua cabeça ou então apagar o sonho. Quem espeta agulhas na imaginação dos outros tem que tirar as agulhas e curar o ferimento. Quem cria lesmas tem comê-las.  Ajeitou-se, fez uma espécie de cama afofando as folhas secas, fechou os olhos e dormiu ninado pelo som das águas do riacho.   Sonhou com a resposta. O pássaro veio e lhe segredou: - Faça todas as pessoas de papel e dobre-as e coloque-as no seu bolsinho. Eu heim! respondeu ele: -  Essa gente toda vai arrebentar meu bolsinho, entretanto, um mundo sem pessoas não seria um mundo feliz. Que valor teria possuir o mundo e não ter as pessoas?
        Continuou a caminhada por muitos e muitos anos. Até que encontrou uma saída: - pegou um papel, desenhou o mundo e colocou nele tudo que achou que um mundo feliz precisava. Encheu de gente boa, animais e vegetais. Dobrou bem dobradinho, começando pela ponta e colocou no seu bolsinho.  
        Acabou seus dias naquele riacho, debaixo daquela árvore e muito satisfeito como dono do mundo feliz.

 

 

 

 

 
Poema publicado no livro "Muito moinho pra pouco Quixote" - Contos - fevereiro de 2018