Alberto Magno Ribeiro Montes
Belo Horizonte / MG

 

 

Casamento moderno

 

 

         Seu Josefino era viúvo, já completara 60 anos e tinha um filho chamado Gustavo, que aos 25 anos ainda morava com ele, nunca lhe deixando faltar nada. Era um filho atencioso, muito carinhoso, que fazia de tudo para não deixá-lo triste. Levava-o para passear, iam ao cinema, academia e até faziam algumas viagens, quando Gustavo tirava férias. Mas o que ele gostava mesmo era quando o filho o chamava para assistir aos jogos do Galo, no estádio. Os dois eram atleticanos “fanáticos” como Seu Josefino dizia. Antigamente ele falava que era atleticano “doente” mas depois que ouviu de um cruzeirense: “Todo atleticano é doente,” sentiu-se ofendido e nunca mais disse isso. Uma coisa porém o inquietava: o filho nunca  teve namorada. Ao tocar  nesse assunto com o filho, ele dizia que ainda não encontrara a pessoa certa. Um belo dia seu filho lhe comunicou que daria uma festa para anunciar seu noivado. Ufa! Até que enfim, pensou. Mas quem é ela, meu filho? É surpresa, papai! Você ficará sabendo na hora, procure não ficar ansioso. Como confiava no filho,  não se preocupou, e aguardou tranquilamente o tão esperado momento.
         Finalmente chegou o grande dia. Seria uma coisa simples, o filho contratou um buffet e até umas músicas seriam tocadas durante  o evento. E Seu Josefino, todo orgulhoso, fez questão de acompanhar a entrada dos convidados, cumprimentando-os um a um, recepcionando a todos com grande simpatia. Cada mulher bonita que chegava ele se perguntava: “Será essa?” Um convidado lhe chamou mais a atenção, pela educação com que o cumprimentou: Muito prazer, Seu Josefino, seu filho fala muito bem do senhor. Tem o maior orgulho de tê-lo como pai. Chamava-se Rubinho, era muito simpático e estava muito bem vestido. Apenas lhe causou estranheza a gravatinha borboleta dele, estampada com coraçõezinhos vermelhos.
         Todos reunidos, era a hora da grande revelação. Gustavo então anunciou que  naquela noite iria ficar noivo, pretendendo se casar brevemente. Chamou o Rubinho e revelou então que ele era seu namorado e que a partir daquele dia seria seu noivo. Seu Josefino, no início, achou que era brincadeira e até achou graça naquelas palavras ditas pelo filho. Ele sempre foi mais sério, às vezes disse aquilo para descontrair o ambiente. Mas quando os dois deram “aquele beijo apaixonado”, na frente de todos, viu que aquilo era verdade. Sua vista ficou turva, sentiu tremedeira, começou a suar, de repente caiu no chão e a partir daí não viu mais nada. Somente algumas horas depois  acordou no hospital, com o filho a seu lado. Desculpe, papai, quis fazer  surpresa e acabei quase lhe matando. Devia ter lhe preparado antes. Foi um grande erro meu. Felizmente foi só um grande susto, como disse o médico que lhe atendeu. Mas meu filho, até agora não estou acreditando, é sério mesmo? Sim, papai, mas fique tranquilo, como sempre, não deixarei que lhe falte nada. Podemos até sair juntos, se o senhor quiser. Rubinho me disse que gostou muito do senhor. Para não contrariar o filho e também não adoecer, resolveu tentar aceita a situação.Teve alta no mesmo dia e procurou não ficar tocando no assunto…  
         Então os dois se casaram e sempre que podiam, iam visitar Seu Josefino que, como não tinha outro jeito, já estava começando a aceitar tudo aquilo. Com o tempo o senhor irá entender, pois Rubinho é uma pessoa muito boa, Gustavo dizia… Procure deixar de lado o preconceito e aceitar as pessoas como elas são. O que ajudou mesmo, foi o fato dos dois serem muito discretos, jamais trocando carícias ou intimidades em público, pois isso Seu Josefino nunca aceitaria por mais que gostasse do filho. Eles agiam sempre como dois homens, dois amigos. E nada de Rubinho chamá-lo de sogro, nem de um apresentar o outro a alguém, na frente dele, como: Este é meu marido!  O que mais chamava a atenção em Seu Josefino, era a educação de Rubinho. Nunca vira um homem tão educado assim: chegava a exagerar no “com licença… por favor…muito obrigado”, etc.
         Um belo dia, Rubinho lhe disse: Soube que o senhor é atleticano “fanático” e eu também sou, então poderíamos ir ao Mineirão no próximo domingo, no jogo do Galo. Gustavo não poderá ir, pois estará trabalhando. Recusar esse convite  era praticamente impossível e então resolveu aceitar. Já no estádio, após o juiz negar uma falta a favor do Galo,  Rubinho se levantou e gritou com toda a força: “Juiz ladrão, viado, vai tomar no c*.” Seu Josefino não queria acreditar no que estava ouvindo, um homem tão fino, tão educado, falando assim… Mas achou o máximo e a partir daquele dia passou a ver o “genro”, com outros olhos e até lhe disse, que quando tivesse outro jogo do Galo, poderia convidá-lo,  que ele iria, sem dúvida.
         Certo dia Seu Josefino adoeceu e como seu filho se encontrava no exterior, a trabalho, Rubinho ficou com ele no hospital, dormindo lá todos os dias em que esteve internado, cuidando dele com todo carinho, sem queixar-se de nada. Sentiu então um grande remorso, ao recordar da vez que sua esposa ficara internada durante uma semana e ele não tivera paciência de cuidar dela, queixando-se de tudo, fazendo as coisas com má vontade e o até mesmo deixando de atender a alguns de seus pedidos.
         Um dia, seu filho lhe disse que ele iria ser avô. Mas como, meu filho?! Dois homens…não tem como! Papai, hoje as coisas estão mudadas. Fique tranquilo, é um processo meio difícil de explicar, mas será tudo dentro da lei. Mas o filho é nosso e  eu é que forneci o material, entende? Seu Josefino achou aquilo muito confuso, mas confiava plenamente no filho, então foi se acostumando com a ideia, esquivando-se de detalhes, pois nunca vira o filho tão feliz e realizado. Quanto ao “genro,” depois daquele jogo…virou seu fã.
         Meses depois seu neto nasceu. Que emoção! O que mais gostava era de carregá-lo no colo, fazê-lo dormir e ficar sonhando com o futuro dele. No fundo de sua alma, em silêncio dizia: Tomara que quando ele crescer encontre um companheiro como o Rubinho e que seja muito feliz…       

 

 

 

 
 
Poema publicado no livro "Contos de Verão" - Edição 2019 - Fevereiro de 2020