Teresa Cristina Cerqueira de Sousa
Piracuruca / PI

 

 

A casinha de madeira

 

        

 

A casinha de madeira não sabia dizer de quando datava sua existência.  Sentia o ranger das portas quando os moradores passavam por elas. Conhecia a força dos ventos e a instabilidade das tábuas das paredes.  A janela da sala já tinha uma fissura, de ter sido corroída pelo sol e pelas chuvas de anos e anos a fio. O teto, bem,  ele ainda parecia conservado - talvez por ter sido reformado no inverno passado... Humn! 
A casinha de madeira ficava próxima da estação férrea.  Não havia calçadas em torno dela, apenas a linha do trem e um descampado  por onde as pessoas iam e vinham.  Estavam sempre apressadas ou com malas, pensava a casinha,  parada em seu lugar.  Alguns a olhavam,  todavia não podiam entrar um pouco  com receio de perderem o horário da partida do trem... O tum-tum-tum dos passos... 
A casinha de madeira era do gerente da estação ferroviária.  O homem morava sozinho.  Ah, mas o gato fazia parte da família! Era um bichinho muito preguiçoso!... Queria e passava o dia dormindo debaixo da cadeira de balanço do gerente.  Ora, o dono da casa só chegava à noite... A casinha de madeira ficava o dia todo sozinha com o gatinho...  Mas viviam bem... O miau-miau chegava na estação.
A casinha de madeira sempre pertencera a  um gerente da estação ferroviária.  E se algum deles tivesse família,  vinham por poucos dias e partiam.  Nhem,  já vão deixar o gerente sozinho aqui outra vez? Esse pensamento ficava colado na casinha de madeira...
E foi assim por anos sem fim... Ai, ai!
Até que um dia não veio mais o trem... Adeus, piui!
Foram invernos e verões solitários, pois o último gato partira com o dono; deixaram a casa vazia... Snif!
Contudo,  ainda que abandonada,  velha,  as tábuas gastas e com cheiro de mofo,  um dia,  numa manhã de sol uma família abriu a porta da casinha de madeira (Rang!)
A casinha de madeira só soube o que era ter criança em casa quando um menino de cinco anos e seu amiguinho iniciaram uma corrida de cavalos com os cabos de vassoura. Foi um dia barulhento - as tábuas do assoalho quase arrancaram na hora em que os cavalos trotaram!... Mas, ufa!... Bom era ouvir o silêncio quando todos dormiam, principalmente,  o do pequeno cavaleiro!... Upa, cavalinho!
A casinha de madeira, então,  soube que estava sendo um lar, e isso a deixou muito feliz.  E gostou de ter suas janelas abertas todos os dias, mesmo que o menino vivesse pulando nelas... Hum, as tábuas ainda resistiriam!... Que uma casa pode ser consertada e pintada... E, assim,  tra-la-lá... Um belo dia ganhou um colorido nas portas, paredes e janelas...
E ainda hoje está lá ao lado da estação, numa fotografia presa numa das paredes da sala da recepção da antiga estação ferroviária e, tique-taque, data de 1923 (há quase cem anos), tempo da infância de meus avós. 

  

 

 

 
 
Poema publicado no livro "E daí?... Como ficamos?..." - Edição 2019 - Janeiro de 2020