Maria Rita de Miranda
São Sebastião do Paraíso / MG

 

 

Coincidências

                

              

          A reunião estava para começar. Casa cheia. De um lado os acadêmicos, do outro, membros de um coral que iam se apresentar. Chamou a atenção de algumas pessoas, uma senhora elegante que ali chegou pela primeira vez. Ela passou perto de um casal de amigos Roberto e Angélica, que distraidamente conversavam. Roberto, ao cumprimentá-la, perguntou:
          -A senhora faz parte do coral?
          -Não. Sou paraisense de volta à terra natal. Saí daqui jovem para morar no Paraná. Esse retorno está me fazendo muito bem. Sou artista plástica.
          -O que, exatamente?
          -Sou pintora.
          -Muito interessante...
          -Talvez você se lembre dos meus parentes que deixei aqui. Sou sobrinha do Pimentão.
          -Nossa, lembro-me  bem dele. Na minha mocidade eu o via andando pelas ruas.
          Ao que Angélica, que estava ao seu lado, indagou espantada e baixinho:
          -Você se lembra do Pimentão?
          -É claro. E você deve se lembrar também. Era um beberrão que vagava meio tonto pela cidade. Acho que ganhou esse apelido porque tinhas a face avermelhada, talvez pelo efeito da bebida.
          Um riso contido tomou conta de Angélica.
          -Você acha que essa senhora é parenta desse Pimentão? Olha o porte dela!
          -Mas foi ela mesma que disse.
          Nova risada.
          -Acho que ela deve ser parente distante do meu marido, que tem Pimenta no nome. Ele já comentou de um antepassado da família, que nem conheci, que tinha o apelido de Pimentão. Foi um grande fazendeiro do início do século XX: Antônio Pimenta de Pádua.
          Os dois riram abertamente. Coincidências...
          A visitante nada percebeu. Sentou-se e assistiu a reunião até o fim. Simpática, veio até mim para se apresentar. Mal sabia que fora motivo de lembranças longínquas de Roberto e da Angélica.
          "Pimentões" que foram relembrados e renderam boas risadas. Do primeiro, o bebum, também me lembro. Serviu até de inspiração para o poeta local, Messias Martins Grilo, que escreveu em seu livro "Poesias, Acrósticos e Canções", versos sobre nossos vultos folclóricos, a ele dedicando a quadrinha:
           "Vamos, pois reviver uma lembrança:
          um popular travesso e folgazão
          inofensivo qual uma criança
          o estimado e saudoso Pimentão."

 

 
 
Publicado no Livro "É tão verdade que ninguém duvida..." - Edição 2019 - Junho de 2019