Neri França Fornari Bocchese
Pato Branco / SC

 

 

Um dia de chuva... com poças d'água

                

 

Uma semana chovendo fazia um frio danado. Não dava para brincar, para correr, as crianças já estavam entediadas. Os adultos cansados de tanta umidade.  Dentro de casa resolveram fazer uma excursão para se entreterem. A sala da casa da Nonna foi o local escolhido.
- Ela avisou, não baguncem. Vocês, depois precisam ajudar a por tudo no lugar.
Eles, numa algazarra festiva iam descobrindo as novidades e atiçando a sua curiosidade, própria de quem tem poucos anos de vida e precisam apreender. Vasculharam por tudo, não houve gaveta que não abriram Não houve caixa que não foi olhada, ainda vinham perguntar o que não sabiam o que era. Entre tantas curiosidades, eles encontraram uma velha e conhecida caixa de tinta guache. Pintar o sete, pintar a vida e lambuzar o chão era o que elas iriam fazer.
Queremos pincéis! -Disseram.
- Não tenho. Os que eu tinha, vocês já levaram todos. Falou a Nonna.
- Então vamos pintar como dedo. É o jeito.
- Lembrem-se que pintores famosos pintaram e pintam ainda hoje com o dedo.Mas não lambuzam nada.
Assim o que parecia ser uma tarde tediosa foi uma tarde, onde um verdadeiro laboratório de obras de Arte foram imaginadas e criadas.
O estoque de papel A4 acabou e olhem era uma resma quase completa.
Às vezes é difícil segurar a petizada, com um pouco de imaginação e boa dose de paciência se consegue.
Pintaram até o Sete. Cansados foram comer pipoca. Uns quiseram com melado e outros pipoca salgada. A Nonna ainda fez um mate doce.
Quase no final da tarde a chuva deu uma trégua. Timidamente o Sol deu os ares de sua Graça. As poças de água se formaram na ruela sem calçamento. Espiaram pela janela e vencendo o friozinho foram até a área.
Sabe Nonna, que não está muito frio! Até parece que o frio está só aqui dentro de casa. Nós podíamos brincar lá fora, só um pouquinho????
- Não sei. E, se alguém ficar com dor de garganta o que vou dizer para os pais de vocês??
Ela pensou quando eu era criança brincávamos nos dias de chuva e, ninguém ficava doente. Andávamos descalços. Não tínhamos tanto casacos e sobrevivemos. Parece que a gente tinha mais resistência. Seria o contato com a Mãe Natureza.
Com esses pensamentos, ela liberou as crianças com a promessa de que quando os chamasse veriam para dentro.
Numa algazarra de como quem teria ganhado uma bicicleta nova foram tirando os calçados e os casacos, arregaçando as calças compridas e foram fazer a festa.
Até parece que o Sol sorriu, ficou mais amarelo. Não houve possa de água que não pularam. Num instante a ruela de chão batido não tinha mais nenhuma possa de água sem ter sido pisoteada.
Brincaram até à tardinha quando o Sol começou a cair por detrás dos montes e, um ventinho frio passou a soprar.
Foi um dos melhores domingos da criançada. Quando foi dado o toque de recolher, não foi preciso chamar duas vezes. Uma a uma foram entrando tirando a roupa molhadinha e suja e indo para o banheiro tomar um banho quentinho. Os maiores ajudaram os pequeninos a se lavarem secarem o cabelo e se vestirem.
A Nonna ficou pensando: muitas vezes uma coisa que parece um desproposito faz um bem danado.
Cada uma tomou um chá de folhas de laranja adoçado com mel. A sabedoria ensina que é melhor prevenir do que aguentar as conseqüências.
Depois foram jantar. Uma canja muito gostosa feita com galinha caipira foi servida. Como era de costume naquela casa de descendentes de italianos, tiveram direito a um golinho de vinho. Vinho feito em casa, com uvas do parreiral plantadas pelo Nonno. Como diz ele o vinho é a bebida mais antiga da humanidade e um golinho não faz mal a ninguém. Sabedoria de quem já viveu por um bom período de anos.
Algumas brincadeiras precisam ser resgatadas. Dormiram o sono dos Anjos, felizes com o dia de chuva e poças d’água.
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Publicado no Livro "É tão verdade que ninguém duvida..." - Edição 2019 - Junho de 2019