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Romilton Batista de Oliveira
Itabuna / BA

 

O fugitivo

 

Procurado por todas as partes do mundo.
O fugitivo.
Ele fugia de si e do mundo. Procurava por caminhos descaminhados e acidentados.
Os jornais noticiavam a sua busca, mas ninguém o encontrava em lugar nenhum.
A polícia recebia ordem para que o encontrasse vivo pois seu crime era fatal:
Ele desobedeceu as estruturas do bem e do mal.
Sem nome e sem-terra e teto, o fugitivo desaparecia do mundo territorializante
criado pelos homens para o aprisionamento de suas almas.
Cada vez que montavam o exército global para achá-lo ele tornava-se invisível.
O fugitivo do tempo e do espaço, era uma alma daquelas que tinha dentro de si
O verdadeiro segredo que desfaz todo o sistema montado pelo poderoso poder
Que aprisiona os homens em suas vidas impostas por homens do poder
O fugitivo tinha uma grande arma que nenhum outro homem foi capaz de construí-la.
Ele carrega em si a capacidade da transcendência multicultural e linguística.
Falava todos os idiomas e possuía o comando que desmontaria todo o sistema
Por meio de suas múltiplas desmontagens históricas e antropológicas
Portador de um saber pluricultural e linguisticamente diferente de tudo
O que a humanidade já viu e presenciou.
O fugitivo foge porque faz parte de sua construção a fuga
É necessário fugir para sobreviver, fugir para sustentar o seu fardo
Fugir para não ser encontrado pelas correntes ideológicas e discursivas
Que aprisionam cada sujeito às suas “castas” embriagas de entupidas formações.
O fugitivo sabe que jamais será alcançado pelas autoridades imperialistas deste mundo, porque ele carrega dentro de si a bomba que explodiria o mundo das ideias que dão sentido a este mundo violentado por esses discursos manipuladores.
Ele anda descalço e nu, mas sem ser visto por ninguém
Ele é puro e incontaminável, não possui ideias nem pensamentos
Carrega dentro de si o peso de todas as línguas e o segredo que as une
É este segredo que o faz fugir da presença do ser
Porque o ser facilmente é passível de ser contaminado
Por um processo de pseudo-alteridade.
O fugitivo é feito de uma identidade única e fixa
Ele tem dentro de si a marca, o sinal, o rastro da verdadeira história da humanidade
Mas ele é potencialmente capaz de jamais ser aprisionado ou preso
Por esses fracos homens que detém o poder na sofrida terra-mãe.
Um dia, seu nome será revelado, e a sua invisibilidade tornar-se-á visível
Mas neste dia, o homem precisa ser outro homem
Precisa descobrir o segredo, ou parte do segredo que faz do homem
Um eterno ser em construção.
Neste dia, o invisível fugitivo declarará ao mundo inteiro o segredo que a humanidade
Precisa saber, mas enquanto ele for perseguido por esse “encosto”
E imposto sistema de pensamento desumanamente desestruturante,
Continuará fugindo da aparência do mal ...
Temos dentro de cada um de nós um pedaço desse fugitivo.
Um dia todos os pedaços que se espalham pela terra se unirão
E uma nova terra será erguida,
Uma terra desterritorializada, sem estriados espaços nem lisos espaços,
O espaço será um lugar onde todos nós poderemos habitar
Um pouco deste fugitivo fez apareceu em Charles Chapplin quando ele diz:
“O caminho da vida pode ser o da liberdade e da beleza, porém nos extraviamos. A cobiça envenenou a alma do homem ... levantou no mundo as muralhas do ódio ... e tem-nos feito marchar a passo de ganso para a miséria e os morticínios [...] Os homens que odeiam desaparecerão, os ditadores sucumbem e o poder que do povo arrebataram há de retornar ao povo. E assim, enquanto morrem os homens, a liberdade nunca perecerá. [...] Soldados! Não vos entregueis a esses brutais ... que vos desprezam ... que vos escravizam ... que arregimentam as vossas vidas ... que ditam os vossos atos, as vossas ideias e os vossos sentimentos!”.
O fugitivo também silenciosamente entrou em tantos outros homens e mulheres que desafiaram o sistema e denunciaram a subalternidade como bem faz Gayatri Spivak e tantos outros “fugitivos” da ordem estabelecida.
Neste momento o fugitivo entra na sala ou no quarto do respectivo leitor para anunciar que você pode este mundo mudar, usando de seu “silêncio invisível”, de sua “fuga potencial”, capaz de desmontar as estruturas de poder que nos escravizam com seus discursos de manipulação.

 

 

 

 
 
Conto publicado no livro "Contos do Vigário e outras Picaretices" - Julho de 2016