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José Vicente Neto
Pratápolis / MG

 

Seabra Consorte

 

Em 1970, quando os televisores começavam a chegar às cidadezinhas do interior, o grande sucesso dos canais de televisão eram os programas de auditório e os carnês dos patrocinadores que davam prêmios, inclusive carro zero quilômetro.

         Os programas de maiores audiências eram o do Silvio Santos com o famoso Carnê Baú da Felicidade, o Chacrinha tinha o Carnê da Girafa, o Flávio Cavalcanti com o Carnê Erontex, e, Airton e Lolita Rodrigues com o Carnê Seabra Consorte.

         Nem precisa falar o sucesso de vendas desses carnês. Todos queriam ganhar o grande prêmio – um carro!

         Nas cidadezinhas interioranas, os carnês chegavam em Kombis, com vendedores educados, bem vestidos e bom de papo. Era um auê naquele dia, todos ficavam nas portas das casas à espera dos vendedores para comprarem seus carnês. Em geral cada família comprava um ou dois carnês.

         Mas, especificamente, na cidadezinha da nossa história, nunca ninguém tirara a sorte grande. Mas os carnês, no final de todos os pagamentos, em dia, davam mercadorias no valor do que fora pago. Claro que o preço das mercadorias era quatro vezes mais que o valor de mercado. Mas, como de certa forma, o investimento era ressarcido, “os consumidores” sempre se animavam e compravam novamente outros carnês.

         Nesta história, uma família, que era fã de Lolita e Ailton Rodrigues, todo sábado assistia o “Almoço com as Estrelas”, ficava emocionada  com a entrega dos carros aos felizardos do Carnê Seabra Consorte e alimentava a esperança de ser um dia contemplada também.

         E parece que os ventos sopraram a favor daquela família.

         Um dia quando a Kombi do Carnê Seabra Consorte chegou trazendo seus educados vendedores, a família da nossa história recebeu a visita de um deles, mas não era apenas um deles, este era o vendedor que trazia na sua valise o sonho do carro zero quilômetro.

         E o vendedor muito comunicativo (e bem treinado) começa especulando sobre o programa da Lolita e do Airton e sobre o carnê. Em pouco tempo já tem informações suficientes para fazer uma oferta irrecusável àquela família.

         Então o vendedor diz  que eles têm o perfil perfeito para serem os ganhadores do próximo carro zero quilômetro e receber as chaves das mãos do famoso casal da TV brasileira.

         Mas, claro, tinha algumas condições a serem observadas.

         O vendedor explica que eles foram escolhidos por ser uma família muito conhecida na cidade e que o programa sempre escolhe uma família conhecida para vender o carnê premiado e com isso aumentar a venda de carnês naquela cidade. Mas para isso é fundamental manter o sigilo e para não despertar suspeitas a família deve comprar 20 carnês, fazer os pagamentos em dia, que um deles, dentro de seis meses será premiado com o carro zero quilômetro.

         Naquele ano, a Volkswagen, com base na nova linha da Variant, introduziu um cupê duas portas, o TL, em substituição ao 1600 sedã quatro portas. Com a mesma mecânica e linha da perua Variant (a diferença estava na linha traseira do teto, mais inclinada), esse veículo oferecia o mesmo conforto. O TL alcançava a marca de 140 km/h e acelerava de 0 a 100 em 20 segundos.

         O vendedor mostrou catálogos desse carro, disse que Volkswagem fizera uma parceria com a Seabra Consorte para dar esse carro aos escolhidos, e que, a família deveria escolher ali, naquele momento, a cor do carro e os acessórios que seriam colocados nele.

         Depois de uma hora de explicações detalhadas sobre a entrega festiva com a presença de Airton e Lolita, o vendedor apresenta o contrato de “ganhador” que foi assinado por eles. A família não teve dúvida em adquirir os 20 carnês. Detalhe: a primeira prestação dos 20 carnês era paga em dinheiro para o vendedor no ato da compra.

         E assim, mês a mês, o pagamento dos carnês era feito pontualmente e a expectativa da família de serem sorteados aumentava a cada prestação que pagavam.

         Depois de pagarem a sexta prestação, de todos os 20 carnês, a euforia era grande para assistirem ao programa de televisão e esperarem o anúncio do vencedor, que certamente seriam eles.

         E assim foi com a sétima, com a oitava... com a última...

 

 

 
 
Conto publicado no livro "Contos do Vigário e outras Picaretices" - Julho de 2016