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Ediloy A. C. Ferraro
São Paulo / SP

 

No obscuro dos desejos

 

Verônica sentia as faces quentes, enrubescidas, traía frêmitos involuntários, suspiros mal disfarçados, arrepiava-se. Os seios intumescidos despontavam na camiseta, os olhos traziam as pupilas dilatadas. Como conviver com aquelas sensações, cada vez mais atrevidas e freqüentes? Tentava disfarçar para si mesma, mas já não estava se contendo na situação.
Nem precisava vê-lo para sentir-se afogueada, intranqüila e lânguida. Para tanto bastava lembrar–se de sua figura, do cheiro de seu perfume, ou ouvir a sua voz máscula, segura, a chamando pelo interfone.
Pensou em demitir-se, arrumar uma desculpa qualquer e buscar outro serviço, o que precisava, com urgência, era manter-se longe da sua presença, sob pena de não conseguir mais se controlar. Era um homem mais velho que ela, a razão de sua incontrolável insegurança e desejo. Temia confessar a alguém o que sentia, poderia parecer um ato condenável de uma jovem sedenta de uma experiência íntima, ousada.
Naqueles momentos de suplícios pessoais, sonhava em tê-lo de forma mais impudica e sacana, desconhecendo a si mesma, até então reservada e tímida. Numa metáfora, via-se como um vulcão prestes à erupção, à deriva da razão e dos bons costumes, a verter lavas incandescentes e devastadoras. Surpreendia-se no banheiro apalpando-se lascivamente, tendo-o no imaginário como companhia. Circunstância em que obtinha relativa paz, lavando o rosto, retocando a maquiagem leve, retornando a seu posto, a escrivaninha de secretária.
A ela cabia ordenar as tarefas ao jovem mensageiro, adolescente com a face marcada por acnes, coisas próprias da puberdade. E este, a levava para o seu paraíso profano e inconfessável, a desejava com tanta gana e luxúria que se envergonhava de seus próprios pensamentos. Bem que no almoxarifado, às escondidas, poderia ser um ambiente apropriado, ah, se ela pudesse imaginar... A seguia com o olhar, observando cada gesto, salivando na malemolência de seu gingado naqueles saltos altos que só denunciavam as ancas bem delineadas, as pernas roliças e torneadas naquele vestido colado. Que tara tinha por ela, razão de suas freqüentes ausências, pretextando usar o sanitário. Ela era sua rainha e ele sempre seu súdito apaixonado, vivia um rompante sufocado nas labaredas de seu íntimo em convulsão, tinha que estar atento no que ela lhe dizia para não se trair se denunciando.  Enrolava a língua ao pronunciar seu nome, dona Verônica. Ficava em seu lugar, numa minúscula mesa, espremido, esperando pelas ordens de sua rainha. Ficava a espreitá-la, cada vez que se levantava de sua cadeira e desfilava pela sala, indo e vindo. A imaginava desnuda, como deveria ser exuberante, a silhueta apertada nas vestes não deixavam dúvidas, a pele morena clara, o sorriso perfeito, cílios arqueados e provocantes, o seios então...
Ela buscava entreter-se naqueles papéis, digitando compassadamente no computador, mas a mente, não raro, voltava-se para o patrão. Seu aroma no ar a embevecia, esforçava-se para identificar o nome da colônia preferida por ele. Pensou em adquirir um frasco para aspirá-lo em sua ausência.
Ao levantar a cabeça, desatenta, cruzou os olhares com o jovem que a assessorava, sentiu que ele queria lhe dizer algo, e que não conseguia. Instantes de hesitação. Teria esquecido de lhe transmitir alguma coisa, por que estava plantado em sua frente a olhando daquela forma, embaraçado e confuso ?
O chamado pelo interfone a tirou do impasse, voltando-se para resolver à voz que a chamava.
Dona Verônica... ( voz sôfrega, angustiada, indecisa do mancebo tímido, ainda bem que ela não percebera a mancha aparente em sua calça,na altura das genitálias)
Levantando-se para atender o chamado, parecendo não ouvi-lo.
Assim transcorriam os dias, cada qual imerso em seus desejos inconfessáveis.
Fim de expediente. O rapazote desejando a colega e esta inebriada pelo chefe.
Em uma esquina, um carro pára, o magnético desce o vidro e uma mulher loura, de saltos altos, roupa colada e luminescente, seios fartos e batom vermelho carmim, obedece ao chamado pelo olhar, sai da calçada, cabeça imersa dentro do veículo, sussurrando alguma coisa, como combinando detalhes...
A andrógina figura em sorriso debochada e matreira entra no carro e partem...
O desejado homem pela jovem moça, vai em aventuras com sua passageira ou passageiro, enquanto o pobre rapaz sonha com a iludida colega...

 

 

 
 
Conto publicado no livro "Contos do Vigário e outras Picaretices" - Julho de 2016