Mamede Gilford de Meneses
Itapipoca / CE
O homem que comia pães
A paróquia das Mercês tinha um sacerdote que reunia parte dos fiéis na
calçada do templo para celebração de boa prosa, oportunidade que atraia a
juventude para dirimir suas dúvidas.
Quando o conteúdo exposto era fraco alguém bradava: antes do capeta
chegar conte a do homem que comia pães...!
Então sob gargalhada o pedido vinha à baila dessa maneira: "Certa vez ia eu
caminho a fora orando copiosamente e de súbito um vulto apresentou-se-me
com a moção: ' sei que o senhor vai virar santo, mas antes da elevação é de
bom grado vossa excelência pagar as contas dos pães que compra nas
padarias, porque alma não tem recurso para tal.
Saiba que na animosidade da pessoa que servia-me de veículo devorei
milhares de pães, não os paguei e até o presente sou penitenciado pela fome,
sofro delírios e a minimizá-los retorno a vossa dimensão à orientar os cristãos
endividados a quitá-las tempestivamente porque a prestação de conta no mundo
etéreo é deveras rigorosa, conforme explico: em vida recebi o cobrador da
"Padaria pão de forno" com boa doze de ameaça, haja vistas que ele dispunha
de razão suficiente para executar-me judicialmente, todavia impulsivamente
ofendi-o e ele prometeu-me vingança.
Dito e feito, pois no dia do meu aniversário recebi do oficial de justiça uma
notificação para fazer-me presente na audiência... sob pena de ser conduzido
pela polícia e responder penalmente por desobediência a ordem legal.
Na referida audiência externei as dores que assediavam-me, em seguida o
juiz perguntou-me:
- Senhor Pedro é do seu conhecimento essa dívida...?
- É excelência. Não quitei-a por falta de grana!
- Hoje está em condição de quitá-la?
- Sim e não...
- Não entendi sua reposta!
- Doutor já comi a mercadoria a qual transformou-se em merda e está servindo
de adubo à mãe terra, se for de gosto do patrão, com a sua permissão vou aos
locais onde depositei-a, empacoto-a e a devolvo.
O magistrado sugestionado pelo discurso do depoente encerrou a audiência
de conciliação e designou data para a de instrução e julgamento.
Seu vigário, exatamente na hora da segunda audiência fui ao chão rolando
quanto um galo degolado e ao dar por mim estava na trempe do inferno ao lado de
dois dos seus".
A bem da verdade o pároco conhecido pela alcunha de Braguinha tinha obsessão
por pães ao ponto de conduzir-los nos bolsos da batina e por coincidência após
encerramento da reunião deu de garras ao saboroso produto; enquanto um dos que
lhe ouvira gritou: " cuidado para o senhor não arder no inferno, tio"!
Sorrindo ele respondeu: realmente gosto de pães, mas os que consumo nada
me custam, pois são advindos das ofertas que recebo da "Padaria Menino Deus"
cuide-se que os diabinhos estão laçando rapazes alegres...
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