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Marina Moreno Leite Gentile
São Paulo / SP

 

Um feliz encontro

Norma Leite é uma prima que tenho admiração, especialmente por sua cultura literária. Por um tempo foi arrimo de família, é um exemplo de mulher de luta. Começou a trabalhar aos 16 anos, em um banco no centro de SP, Rua XV de novembro, conhecida como a rua dos bancos. Foi seu primeiro emprego.
No período do almoço é aquele momento de pagar conta, de dar uma voltinha nas lojas ao redor, etc. Foi num momento deste que minha prima observou, quase em frente ao seu trabalho, um senhorinha que chamava a atenção. Era uma senhorinha simples, simpática, sentada em um banquinho . Ao lado havia um tipo de mesinha improvisada, com alguns livros. Estava acompanhada de um senhor oriental, ajudando-a.
Minha prima ficou curiosa, então parou, conversou com aquela senhorinha por alguns minutos. A senhorinha elogiou minha prima, por seu interesse em leitura, sendo tão jovem. Norma comprou um livro, recebeu o autógrafo, em seguida retornou para o seu trabalho, pois já estava no horário.
A jovem não sabia, mas estava diante de uma pessoa diferenciada, única. Estava diante de Carolina Maria de Jesus, ex-catadora de papéis, uma mulher de luta, uma mulher que surpreendeu quando um jornalista divulgou seu diário. Primeiro foi um artigo em uma revista famosa da época, depois aconteceram os livros, inclusive no exterior.
Ao relatar sua realidade difícil, estava mostrando para as pessoas como é a vida em uma favela, no extremo da marginalização, da fome, etc. Ela viveu situações de muita dificuldade, mas foi uma mulher persistente no zelo dos seus 3 filhos. Ler e escrever era o seu refúgio.
Carolina Maria de Jesus nasceu em 1914, faleceu em 1977, um pouco depois de minha prima tê-la conhecido. Quase 40 anos após este lindo encontro, tomei este livro emprestado. Passei o último dia de 2015 lendo-o e terminei no início da manhã do primeiro dia de 2016. Foi melhor que qualquer festa. Selecionei algumas frases mencionadas no livro dela:

Livro: QUARTO DE DESPEJO

- A primeira coisa que faço é abrir a janela e contemplar o espaço.
- Gosto de manusear um livro. O livro é a melhor invenção do homem.
- Todos têm um ideal. O meu é gostar de ler.
- Eu prefiro empregar o meu dinheiro em livros do que em álcool.
- Parece que vim ao mundo predestinada a catar. Só não cato a felicidade.
- A revolta surge das agruras.
- A palavra da moda, agora, é aumentou. Aumentou.
- A saudade é a amostra do afeto.
- Quem entra na réstia vira cebola.
- Temos só um jeito de nascer e muitos de morrer.
- Quem escreve gosta de coisas bonitas. Eu só encontro tristezas e lamentos.
- Será que Deus ficou de mal comigo?
- Gostaria de recortar um pedaço do céu para fazer um vestido.

Grande pessoa a Carolina Maria de Jesus. Gostaria de voltar no tempo, ter a oportunidade de conhecê-la como aconteceu com minha prima. Que privilégio!


 
 
Conto publicado no livro "Contos de Verão" - Março de 2016