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Neri França Fornari Bocchese
Pato Branco / PR

 

Foi num Verão, o sonho em pesadelo

Era uma vez, pois é sempre assim que começam as histórias encantadas; aquelas que fazem parte de um tempo mágico. Trazem carinho, doces lembranças.
Em uma casa de madeira, entre a sombra amiga de algumas árvores, onde havia muito amor, onde se vivia o dia a dia em contato com a vida. A mudinha foi trazido, pelo pai Roque, uma bem pequenina, pois não tinha ferramenta para arrancar  e nem para plantar uma maior.
Trouxe lá dos Campos de Palmas, o Campo dos Biturunas, onde prestava serviço para o DER. Plantada com carinho, pertinho do coqueiro amigo. Foi regada com a água do poço, tirada com o balde, puxado pela manivela e, com uma boa conversa, pois as plantinhas gostam de carinho, de cuidado. Foi a pequena árvore crescendo.
Cresceu junto com o primeiro filho. Era ela especial, fez um tronco como nunca se viu. Convidava ao aconchego. Dividiu-se em três partes. Três o número do equilíbrio, da União. Dos Três Porquinhos, história infantil que encanta. Três são os Poderes. Na Bíblia, a Santíssima Trindade, Deus Trino e Uno. Jesus Ressuscitou, no terceiro dia.
   A arvorezinha foi crescendo com a família. Vieram outros filhos,  sobrinhos, afilhados e vizinhos. Os meninos mal caminhavam, era nela sempre a primeira árvore a ser escalada, nem que fosse com uma boa ajuda. As crianças brincaram, cresceram dependurando-se em seus galhos. Embalaram  seus sonhos nesses galhos especiais. A curvatura de um deles era inédito seguia reto em busca do infinito e, de repente curvava-se para o Norte, outra vez buscando em linha reta, o Horizonte. Quantas cambalhotas, foram feitas, perdeu-se a contagem. Quantas vezes o lanche da tarde era em seus galhos. As caçadas imaginárias, as conversas de crianças desfrutadas com alegria. As primeiras leituras. O balanço, ali pendurado. Brincar de esconde-esconde subindo lá no alto da copada. Quando pequeninos subiam, depois tinham medo de descer, era preciso o carinho de um adulto para chegarem ao chão novamente.
Sentiam-se grandes exploradores dos sertões.  Eram eles, o próprio Tarzan, em seus galhos.  Foi conquistando, a todos, sendo aos poucos a Árvore da Família.
Estava plantada bem na entrada da casa. Fazia sombra na pista, a onde fica o carro, antes de entrar na garagem, protegido do Sol.
Junto um coqueiro, cresceu esguio, muito rápido buscou as alturas. Lá do alto dominava a paisagem. Foi plantado antes mesmo de casarem-se os  proprietários de um Paraíso.
Quando a professora ia para a escola de manhãzinha passava, regava a pequena muda. Adulta tinha uns coquinhos saborosos, suculentos.  Ao ladinho uma araucária, plantada quando o primeiro filho completou 40 dias.
Todo o dia, recebiam Bom Dia, da dona da casa. Na volta do trabalho ao estacionar o veículo, um carinho com o olhar ou  um afago com a mão.
Seu tronco era regular, bem lisinho. Não oferecia perigo algum. As folhas bem verdes eram refrescantes nas Tarde de Verão.
A fruta o araçá, nome indígena, em Tupi quer dizer: “planta que tem olhos” uma alusão às suas sépalas. Planta, arbustiva, cujo fruto tem o sabor como da goiaba. Embora um pouco mais ácido, possuísse um perfume marcante. A árvore Bendita produzia frutos vermelhos.
O araçá utilizado também para a recuperação de áreas degradadas, pois tem crescimento rápido, atrai a fauna. Sua frutificação ocorre na primavera e no verão.
Assim a árvore benfazeja, além da sombra, do fruto oferecia um suco refrescante.
Era frondosa, pois tinha mais de 40 anos. Testemunhou a rua crescer, se modificar. De terra batida, a ter calçamento, depois asfaltada. Todos os meninos daquele tempo, daquela quadra, que  era só de meninos, brincaram eles, em seus galhos. Muitas vezes se penduravam, se aconchegando, só para conversarem.
Os anos foram passando, as crianças cresceram. Casaram-se. Tiveram filhos, agora eram os netos a brincarem em seus galhos aconchegantes. Serviu gerações.
Na sombra dessas árvores onde ainda havia um butiazeiro tinha um banco de ferro, com a madeira do assento, pintada de Branco.
Quanta leitura nessa sombra amiga. Quanta conversa entre familiares,  amigos que por ali passavam, descansavam. Com uma boa almofada até uma soneca era revigorante.
Os fins de tarde, um bom chimarrão, renovava as forças perdidas, os desalentos acumulados pelo cansaço do dia de trabalho. Era esse lugar, um verdadeiro oásis dentro da cidade que se fez barulhenta com o passar dos anos.
Pensando em construir, pois a casa de madeira envelheceu, a primeira exigência foi sobre as árvores, um membro da família. Era ela tão importante, como construir uma casa nova. Sonho de muitos anos. Era expressão de alguns anos: depois que os meninos se formarem, faremos a nossa casa.
Um sonho muito grande. Um sonho que valeu muitas lágrimas. A exigência era de conservar a árvore como também o coqueiro amigo.
Um mimo, quando seu cacho amarelo dourado, depois da bela florada produzia os frutos saborosos. O pinheiro, não precisava fazer exigência, pois é preciso licença do IAP. O terreno espaçoso, não trazia obstáculos, para a preservação. Foi conversa muitas vezes repetida e lembrada.
Até na medição, o quadro traçado, defendia a árvore, o pé de araçá, o coqueiro.  Começam as escavações e, numa bela manhã ao voltar da Universidade, uma máquina já tinha derrubado o Grande Tesouro.
- Como se foi pedido de resguardar? Soluçou a proprietária, amiga da natureza.
Explicação fútil de quem não tem palavra, de quem é insensível a um carinho com a Natureza. 
- É só plantar outra árvore. Como? E, a História de Vida. O tronco único, tecido pela vida de maneira especial. A exigência que foi feita tantas vezes. A história de amor que traziam???!!!
- Os galhos vão bater no beiral: disse um dos responsáveis pela ordem de acabar com a bela planta.
Embora não adiantasse mais justificar, foi dito como desabafo: Façam o beiral menor.  A casa podia ter menos metros. Construam, mais para trás, há terreno para isso. Nem o coqueiro imune de corte escapou.
Ah! O tronco tenha caruncho. Desculpa boba. Depois de cerrado não tinha nada. Era lisinho.
Foram muitas lágrimas. Desolação e, aquilo que era para ser uma vitória, construir a casa dos sonhos, o fruto do trabalho, perdeu a graça.
A senhora que amava as árvores, como ama os filhos, os netos. Não entrou mais na construção, não deu mais palpite algum, faltava coragem, o preço foi enorme.  Foi como a morte de quem era também amada.
O recanto encantado perdeu-se nas brunas do tempo.
Quando foi ficando pronta e, era preciso decidir como seria a cor, o assoalho, não foi nada fácil, transpor a porta. Sentir o cheiro do araçá. O farfalhar de suas folhas amigas. A cabeleira muito verde, esvoaçando ao vento do velho coqueiro amigo. As corucacas que buscavam abrigo catavam com seus bicos compridos e curvos, os bichinhos que tentavam esconder-se, para alimentarem-se, desfrutando do por do Sol.
Em fim foi preciso muito tempo para que a casa fosse necessariamente aos poucos, adotada pela sua proprietária. Não havia proventos, para construir outra distante dali.
Numa manhã de verão, a árvore da Família, a Árvore da Vida, em um Jardim do Éden, de propriedade particular, foi destruída. . .
Junto com ela, os sonhos um coqueiro símbolo de Amor.

 
 
Conto publicado no livro "Contos de Verão" - Março de 2016