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José Vicente Neto
Pratápolis / MG

 

Quando o sol mergulha no mar

 

Aquela sempre fora uma praia tranquila: ondas calmas, brisa suave, areia aveludada, sombra de coqueiros. Nos dias de verão, as manhãs são esplendorosas e as tardes românticas. Vez ou outra, uma chuva refresca o ar.
Todos os dias, após o trabalho, Mariana, que mora num edifico a dois quarteirões, vem à praia para ler. Uma rotina: numa bolsa traz livros, água, bolachinhas, protetor solar, uma esteira, toalha. Como um ritual: chega à praia, vai para a sombra do coqueiro, “o seu coqueiro”, estende a esteira, senta-se sobre ela, olha longamente para o mar. Depois abre um livro e lê. Faz pausa na leitura para olhar novamente o mar. Novamente lê. Outra pausa para contemplar a brisa que acaricia seu corpo.
Um intervalo: uma água, uma bolacha, um olhar de quem espera.
Retoma a leitura até o sol se pôr. Às vezes termina um livro, outras vezes não. Mas, sempre termina o dia assistindo o sol mergulhar no grande oceano incandescente. Daí junta suas coisas e volta para casa.
Um novo dia começa e Mariana começa com ele sua rotina diária. Levanta; toma café em casa; vai para o trabalho; almoça no refeitório da empresa; à tarde retorna para casa – e sua melhor hora do dia começa: ir à praia ler!
Mas aquela tarde estava diferente. Via-se de longe um mar muito tranquilo e um perfume incomum e suave vinha com a brisa que soprava do mar. Nada que pudesse parecer anormal, apenas algo de diferente estava acontecendo naquela tarde de verão.
E qual surpresa Mariana teve ao chegar no “seu coqueiro”? Havia uma esteira igual a sua, uma toalha jogada sobre ela e uma mochila com livros. Ao mesmo tempo em que tudo aquilo parecia estranho, também lhe parecia muito familiar.
Mariana, então, desta vez, não espontaneamente, resolvera ficar um pouco mais distante do “seu coqueiro” e observar quem estaria ocupando então, o “seu lugar” naquele dia.
Não demorou muito. Quando Mariana fez a primeira pausa em sua leitura para contemplar o mar calmo daquele dia, um rapaz já estava no “seu coqueiro” com um livro na mão. Também posicionado de frente para o mar, de forma que ela o via pelas costas.
Desta vez, ela não contemplara o mar; ela, inconscientemente, apenas observava o rapaz que lia; como se houvesse algo familiar naquela cena.
Depois de algum tempo, hipnotizada pela cena, é surpreendida por um movimento rápido do rapaz que deixa o livro de lado e deita de bruços. Então ela meio sem ação, ou medo de uma ação, resolve retomar a sua leitura, pensando que não há nada de errado com o que está acontecendo.
Consegue retomar sua concentração de sempre e quando chega o fim do dia, hora de ver o sol mergulhar no mar, percebe que o rapaz, nem os pertences dele, estavam mais no “seu coqueiro”.
Mariana retorna para casa com todas as imagens da tarde repassando em sua memória.
O dia seguinte chega e recomeça a rotina dela.
Hora da praia. De longe já se vê “seu coqueiro” novamente ocupado. A mesma esteira, a mesma mochila. Mariana toma a mesma atitude de ir para outro lugar. Só que resolve passar bem perto daqueles pertences e observá-los. Além da esteira ser igual a dela, a mochila, bastante surrada, tem algo de familiar. – Não! Existem muitas mochilas dessa marca: pensou ela. E segue para o seu forçado “novo lugar”.
Coincidentemente, quando faz a primeira pausa em sua leitura para contemplar o mar, o mesmo rapaz já estava no “seu coqueiro” com um livro na mão. E tudo se repete: num movimento rápido do rapaz que deixa o livro de lado e deita de bruços. E ela sem ação novamente, ou medo de uma ação, resolve retomar a sua leitura, pensando que não há nada de errado com o que está acontecendo.          Consegue retomar sua concentração de sempre e quando chega o fim do dia, hora de ver o sol mergulhar no mar, percebe que o rapaz, nem os pertences dele, estavam mais no “seu coqueiro”.
E as horas de praia, durante uma semana, tornam-se um dejà vu.
Mariana resolve romper o medo e agir.
Nesse dia, na hora da primeira pausa, ela junta todas as suas coisas e vai em direção ao “seu coqueiro”. Encontra o rapaz concentrado na leitura. Ela, para não recuar, pergunta rapidamente o que ele estava lendo. O rapaz, sem olhar para ela, responde: – leio: O amor que foi embora mata um pouco a cada dia. Ela diz que nunca ouviu falar desse livro.
Então, encoraja mais um pouco e reivindica o “seu coqueiro”:
– Moço faz uma semana que vejo você frequentando essa praia e ocupando o “meu coqueiro”. Sim, esse coqueiro é meu, desde que me mudei para cá há 8 anos e agora nessa semana perdi meu lugar para você.
O moço levanta num sobressalto, como quem se assusta. Pede desculpas dizendo que não veio atrapalhar nem causar tristezas, que tristeza na vida, já bastava a dele.
Quando ele fica de pé e olha nos olhos de Mariana, deixa o livro cair. Ela quando vê aquele olhar penetrante, sente uma vertigem e quase cai. O rapaz a segura nos braços e continua olhando-a fixamente.
Ainda nos braço dele, mesmo depois de se refazer, ele olha intensamente para ela e pergunta: – Mariana é você? Mariana atônita faz a mesma pergunta: – Pedro é você? Eles se confirmam. – Sim.
Precisaram sentar. Conversaram demoradamente. Choravam, riam, abraçavam-se.
Quando o sol terminava seu mergulho diário, um beijo selou o reencontro.

 

 
 
Conto publicado no livro "Contos de Verão" - Março de 2016